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Paulo Cancian: para sempre na memória

por Pablo Ribeiro

O Conectado Perfil deste sábado presta uma homenagem ao jornalista, que faleceu em 20 de dezembro de 2018

Foto: Moisés Kafer/Divulgação

O Conectado Perfil deste sábado (05) presta uma homenagem especial ao jornalista Paulo Cancian. A entrevista foi concedida ao jornalista Pablo Ribeiro, em junho de 2016, para um trabalho acadêmico do curso de Jornalismo da UCS. À época, Cancian atuava como chefe de gabinete do ex-vice prefeito Antônio Feldman.

A história de Paulo Cancian renderia um livro, ou até mesmo um filme. O homem que transformou a maneira de fazer comunicação morreu no dia 20 de dezembro de 2018. Cancian vivia com seu estilo simples, sempre tratando a todos com simpatia e atenção.

Durante a vida, sofreu com alguns problemas de saúde e tentava levar uma vida mais saudável e tranquila. Semanalmente, apresentava o programa “Caxias Memória”, na Rádio Caxias, onde entrevistava pessoas importantes da cidade. Paulo Cancian, a história de vida que se confunde com a história da comunicação.

Ouça o programa aqui: PARTE 1  |  PARTE 2  |  PARTE 3

 

Primeiros passos

Em 1º de maio de 1951, na cidade de Passo Fundo, nascia Paulo Renato de Marques Cancian, o primeiro de oito irmãos de uma família muito pobre. Seu pai, José Francisco Cancian, era professor e ex-religioso, e a mãe, Nair Pereira Marques Cancian, filha de ferroviários. A avó materna de Cancian lavava roupa para hotéis e seu avô era maquinista de trem. Por parte do pai, seu avô era um imigrante italiano chamado Giusepe Cancian, e sua avó chamava-se Helena Santin Cancian. “Eu nasci num hospital, no quarto 27, na hora que começou o foguetório em comemoração ao dia do trabalhador, às 7h45min da manhã”, brinca o jornalista.

Cancian morou em Passo Fundo por pouco tempo. Seu pai era irmão marista e precisava de um emprego e partiu, juntamente com a família, para Erechim. Suas habilitações eram em português, matemática, desenho, latim e francês. Segundo Cancian, seu pai possuía essas múltiplas habilidades porque os irmãos maristas eram treinados para atender e dar conta de uma aula inteira. O até então menino Cancian estudou em escolas públicas e privadas. “Quando o pai tinha condições, ele fazia uma permuta onde eu podia estudar na escola que ele lecionasse”, revela ele.

Cancian lembra com saudade dos fatos que marcaram a sua infância. Um deles foi em 1962, quando ele tinha 11 anos e a Campanha da Legalidade eclodia. Ele recorda que foi nesse período que surgiu sua maior paixão: o rádio. Paixão essa que o acompanha até os dias de hoje. “Eu ficava ouvindo a rádio Legalidade enquanto ela estava no ar. Eu não ia dormir. Tanto que quando o Brizola disse que ia convocar as pessoas pra irem defender o palácio eu já estava pronto pra ir e a minha mãe ficou furiosa, inclusive pelo resto da vida (risos)”, relembra. Foi então que Cancian começou a sonhar em trabalhar em rádio, mas achava que tinha a voz ruim.

O futuro comunicador lembra que na infância foi uma criança muito ativa, sempre participando de eventos escolares. A inquietude de Cancian fazia com que ele quisesse participar de tudo, desde o teatro, a banda marcial da escola e até na missa dos domingos, como ele próprio relembra.

Cancian fala com orgulho dos feitos do seu pai, pois foi ele que desenvolveu a criação do Ginásio Noturno para Trabalhadores, que um tempo depois, se expandiu para todo o estado e passou a se chamar Eduacação para Jovens e Adultos, o conhecido EJA. “Meu pai era um professor nato, e muito apaixonado pela docência. Um religioso cheio de conselhos para dar e que valorizava muito a família”, lembra Cancian.

Mas o pai de Cancian, aos poucos foi percebendo que em Erechim já não existiam muitas possibilidades de emprego, mas mesmo assim conseguiu arrumar um trabalho para Cancian. “Nós tínhamos uma filosofia em casa. Até os 14 anos, o pai dava tudo. Depois, cada um tinha que se virar, e ele conseguiu pra mim um emprego em uma gráfica, pra eu não ficar muito vadio. Então esse foi meu primeiro emprego, onde eu trabalhava na montagem de bloquinhos de notas fiscais”, revela ele. Nesse emprego, Cancian ficou por apenas seis meses, pois, segundo ele, além de não gostar, o ambiente era muito insalubre. Logo depois, ele descobriu que quem pagava o seu salário não era a gráfica, e sim seu próprio pai, que repassava a verba sem que ele soubesse.

Em 1966, José Cancian então soube que iria ser construída uma universidade em Caxias do Sul, e ele queria que os filhos estudassem nessa universidade. Segundo Paulo Cancian, seu pai teve problemas na época da revolução, pois os oposicionistas achavam que ele fazia parte do Grupo dos Onze, grupo de esquerda nacionalista que apoiava as ideias de Jango. Desgostoso, o pai de Cancian então resolveu arrumar as malas e, juntamente com a família, se mudar para Caxias.

 

O recomeço em Caxias

Logo que a família Cancian se estabeleceu em Caxias foi estudar na escola Cristóvão de Mendoza, na qual ele sente um carinho até os dias de hoje, pois foi lá que ele constitui grandes amizades, pois todos os vizinhos também estudavam no Cristóvão e se encontravam no caminho da escola. Quando estava na quarta série do ginásio, Paulo Cancian se candidatou para ser goleiro do torneio interséries de futebol, pois o goleiro fixo não pôde participar. Por coincidência da vida, o goleiro que não pôde participar era Paulo Rodrigues, jornalista que faria história na comunicação em Caxias.

Cancian mostrou um bom futebol, e logo foi convidado pelo professor Juliano Viegas para integrar a seleção do colégio, e consequentemente foi indicado para o time juvenil do Juventude.

Sabendo que precisava trabalhar, Cancian conseguiu emprego na Mapro, empresa de propaganda, onde ele permaneceu por um ano e meio.

Um divisor de águas na vida de Cancian aconteceu em um dos treinos do Juventude, onde chovia muito e ele acabou sofrendo um choque na mão e destroncando todos os ossos. Durante seis meses, Cancian teve problemas com a mão e ficou impossibilitado de trabalhar e muito menos de jogar futebol. Sem a assistência do clube, Cancian se desencantou e desistiu da carreira de jogador.

 

O início no rádio

Desde a infância, Cancian lia muito. Inspiração que vinha do pai, que o pedia para ajudar a corrigir as provas de português de seus alunos. Sabendo ler e escrever, ele então resolveu que queria trabalhar em rádio. Em 30 de dezembro de 1968, Cancian foi levado pelo seu pai para a Rádio Caxias, onde o diretor era Gildo Flores, ex-aluno de seu José. Cancian entrou com a ideia de ser locutor e teve que fazer alguns testes de leitura de textos comerciais e de notícias. Cancian não passou pelo teste, pois sua voz estava trocando mas um lugar estava garantido na rádio. “Me falaram então que abriria uma vaga para redator, e eu aceitei, pois o que eu queria era estar dentro da rádio”, conta ele.

Cancian entraria na vaga que era de Jules Borgueti, que ele considera como uma referência no jornalismo. Borgueti sabia que seria demitido e disse para Cancian que o prepararia para ser um bom jornalista. “O Jules foi o meu professor de rádio. Ele fez um cronograma de horários que eu tinha que ouvir as rádios do mundo inteiro. Era um aparelho enorme onde tinha um gravador de rolo que se acionava com o pé. Depois de gravar, eu tinha que ouvir e passar as informações para a máquina de escrever”, relembra ele.

Cancian começava a comparar como as emissoras do Brasil trabalhavam as informações que vinham do estrangeiro. Apartir disso, ele começou a desenvolver a própria redação. Cancian ficou por muito tempo sendo o único repórter e redator de todos os noticiários da Rádio Caxias. Paralelo a isso, Cancian ainda cursava Letras na parte da tarde, e a noite retornava para a rádio. E na Rádio Caxias, Cancian aprendeu a fazer tudo, desde a programação musical, até a operação dos aparelhos. Uma curiosidade que Cancian conta é que foi ele quem criou o modelo de convite para velórios e enterros, padrão que é utilizado até a hoje.

 

Do rádio para a TV

Quando Paulo Cancian começou a trabalhar na Rádio Caxias, estava-se finalizando o processo de consolidação da então TV Caxias, atual RBS TV na cidade. Quem gerenciava a TV eram os mesmos diretores da rádio, capitaneados por Nestor Rizzo., então Cancian achava que deveria também aprender a trabalhar no novo veículo. Foi através do Sr. Osvaldo Ferreira, dono da Soma Publicidade, que Cancian começou a aprender sobre televisão. Ferreira arrendou um espaço de cinco minutos antes do Jornal Nacional e precisava de um redator, cargo dado a Paulo Cancian, que saiu da Rádio Caxias para se dedicar à nova empreitada. “Eu me encantei com a televisão. Aprendi também um pouco da técnica, pois não existia vídeo tape, era tudo ao vivo”, lembra ele.

Quando a Rádio Caxias completou 25 anos, Seu Gildo Flores precisava de um repórter para a unidade móvel, e Cancian foi convidado para retornar aos microfones da rádio. Durante muito tempo, ele trabalhou para a Caxias e para a Soma Publicidade ao mesmo tempo, mas devido a uma crise econômica, Cancian ficou apenas seis meses na Caxias. Logo depois, em 1970, Cancian foi contratado pela TV Caxias para ser o chefe de jornalismo da emissora. Após esta primeira passagem pela TV, Cancian ainda trabalharia na Rádio Difusora, Jornal do Commercio e Correio Riograndense.

 

A assessoria e o impresso

Após uma breve passagem pelo Jornal de Caxias, Cancian recebeu uma proposta de Abrelino Vazatta, então reitor da Universidade de Caxias do Sul, para ser assessor de imprensa da instituição. Foi o primeiro trabalho de Cancian como assessor. Após, o Jornal de Caxias foi vendido para Bernardino Conte, dono do Jornal Pioneiro, e o jornalista Renato Henrichs convenceu Conte de que, com a fusão dos dois jornais, necessitava-se de um novo repórter, e Cancian então retornou ao jornal, trabalhando paralelamente ao trabalho de assessor da UCS.

 

O pai da ‘Folha’

Durante algum tempo, Cancian teve o sonho de criar um novo jornal semanal, na qual chamaria novamente de Jornal de Caxias, mas viu que as oportunidades na cidade estavam cada vez mais escassas. Segundo Cancian, o momento era de ‘partir pra outra’. Cancian então ligou para Antônio Brito, ex-governador, e que na época era porta-voz do governo de Tancredo Neves, pedindo uma oportunidade em Brasília. Brito havia sido chefe de Cancian um tempo antes na Caldas Júnior. Em 1988, ele então foi convidado para trabalhar na Agência Nacional, que produzia a Voz do Brasil. Com as malas prontas e passagem comprada, Cancian recebeu uma inesperada ligação de uma pessoa que mudaria seu destino: Paulo Triches. “Eu não o conhecia pessoalmente e ele me perguntou por que eu estava indo para Brasília, e eu respondi que ninguém me queria mais em Caxias. Ele me questionou sobre o projeto de um novo jornal e me disse que era pra eu cancelar a viagem e ir falar com ele no dia seguinte. Conversamos das 8 da manhã até as 13h30. Aí ele contou a vida dele e os seus projetos, e eu contei a minha vida e os meus projetos. Ele me convidou pra trabalhar com ele e nós fizemos apenas duas promessas, um para o outro: eu pedi para que ele nunca erguesse a voz pra mim, e pediu pra que eu não o abandonasse na metade do projeto”, recorda Cancian.

Em 27 de setembro de 1988 nascia o jornal ‘Folha de Caxias’. Primeiramente o jornal era para ser apenas semanal e um tempo adiante se transformar em diário. E no ano seguinte, em 21 de novembro, o jornal passa a ser diário e se transforma na ‘Folha de Hoje’, um jornal que fez história na comunicação da cidade.

No ano seguinte, Fernando Collor de Melo assume a presidência da república e congela as poupanças. De acordo com Cancian, boa parte das economias de Paulo Triches estavam em contas poupança. A ‘Folha’ fechou suas portas em 31 de outubro de 1994. Muito emocionado, Cancian conta que até hoje os profissionais que trabalharam no jornal se encontram anualmente. “Foi uma história de comprometimento levada às últimas consequências. Foi a maior obra da minha vida profissional”, revela ele.

 

UCS TV: um projeto ousado

Em 1995, Cancian ganha o cargo de coordenador da comunicação social da Universidade de Caxias do Sul, pois a titular do cargo passaria a cuidar do NPAV, que era o Núcleo de Produção Audio Visual, o embrião da UCS TV. O então reitor da Universidade, Rui Pauletti, recebi muitas críticas pela qualidade da programação, que na verdade não existia. O NPAV mandava fitas para a NET, que era a responsável por colocar no ar, o que dificultava manter um padrão de horários pra os programas entrarem no ar. Irritado com essa situação, Pauletti levou Cancian até o NPAV e determinou que ele fosse o novo responsável pelo núcleo. Cancian então teve plena liberdade para colocar o canal no ar e pediu para NET a extensão do cabo de fibra ótica até a universidade, jamais imaginando que seria atendido, mas foi. Paralelamente, Cancian também passou a se dedicar na concepção do Cetel, que já estava em construção.

Com a UCS TV no ar, Cancian necessitava de profissionais qualificados. Foi então que contratou nomes como Paulo Rodrigues e Evandro Fontana. Além disso, pediu para a professora de jornalismo Marliva Gonçalves para que selecionasse alguns dos melhores alunos para trabalharem na nova emissora.

Cancian então partiu para Porto Alegre para conversar com o pessoal da TVE, que tinha um sinal em Caxias, mas deixou de utilizar devido a problemas técnicos. O diretor do canal, Vieira da Cunha, recebeu Cancian. Os fizeram um acordo de que a UCS TV transmitiria o sinal da TVE em determinados horários. Em 28 de maio de 1998, foi lançada a grade de programação própria da UCS TV.

Os últimos atos de Cancian na comunicação da universidade foi a busca das emissoras de radio. As concessões vieram e foi formada a rede de rádios UCS FM, em Vacaria, Bento Gonçalves e Caxias. O ‘pai’ da UCS TV se aposentou em 2005, após sofrer um infarto e ficar três dias internado na UTI.

 

A família e os conselhos

Cancian casou-se em 1975 com Justina Inês de Farias. Conheceram-se na TV Caxias, onde Inês fazia parte do departamento comercial da emissora. Dois anos depois, nascia sua única filha, Tassiana, que o presenteou com três netos, Gabriel, João Guilherme e Davi.

Um profissional com uma história invejável, e que sempre está disposto a transmitir a experiência à nova geração. “Nós precisamos ter um horizonte muito maior. Hoje, o profissional deve ser multimídia, e tem que saber operar tudo, tem que descobrir novos nichos de mercado. A pessoa que é vocacionada para a área da comunicação tem que perceber que não pode ser refém dos veículos. É preciso pensar como empreendedor. O prestígio só vem depois de mostrar credibilidade, então não pense apenas como jornalista, e sim como um profissional da comunicação”, aconselha Cancian.

 

Adeus ao mestre

Cancian  faleceu no dia 20 de dezembro de 2012, aos 67 anos, no Hospital Geral, onde estava internado para tratamento de complicações de uma infecção por diabetes. Ao longo de 2017, chefiou a Assessoria de Comunicação Social do Legislativo caxiense e organizou o livro dos 125 anos da instituição.

Na Festa da Uva, atuou como vice-presidente de comunicação da Comissão Comunitária, nos anos de 1998, 2000 e 2010, e como assessor especial da Presidência para Assuntos de Comunicação da Festa da Uva 2012. Na edição de 2016, responsabilizou-se pela Assessoria de Comunicação da Festa.

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