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Nota do país da pizza

Gislaine Marins

O pizzaiolo da pizzaria na esquina da minha casa adora o Brasil. Quando não está fazendo pizza, ele está na academia fazendo jiu-jitsu. Perguntei se ele gosta de capoeira. Ele disse que prefere jiu-jitsu. Desafiei-o num confronto: quem é batizada na capoeira não perde a majestade nem a altivez das raízes. É claro que vou perder na luta: não consigo sequer amassar decentemente uma massa de pizza, faltam-me os músculos para a rasteira.
O pizzaiolo perguntou se já fui a Torvaianica, uma das praias de Roma, frequentada por todos os brasileiros da cidade. Disse que não. Ele acha que não sou brasileira, porque todos os brasileiros vão para Torvaianica quando faz calor. Também não sou romana, porque todos os romanos vão para a praia quando faz calor. Domingo, enquanto todos os brasileiros e todos os romanos estavam na praia, eu estava em um parque abandonado na cidade com o meu cachorro. Ele agradeceu abanando o rabinho.


O pizzaiolo é romano e faz pizzas ótimas: pizza margherita, pizza romana, pizza napolitana, pizza com flor de abóbora, pizza com abobrinha, pizza com batata, pizza com salame calabrês, pizza com presunto cozido, pizza com alcachofra e vinagre balsâmico, pizza com camarão, pizza sem nada, pizza recheada. Ele não faz pizza com presunto e abacaxi, porque essa pizza não existe.


Os brasileiros adoram pizza. Ele acha isso mesmo sem conhecer a nossa política. Está quase convencido de que eu não sou brasileira mesmo, porque eu não gosto tanto de pizza, prefiro o bolinho de arroz recheado com muçarela. Quando me vê, ele nem espera o pedido, vai logo ao balcão e me entrega o bolinho. É que sou freguesa!
Disse para ele que acompanho a política, não gosto de pizza e não frequento a praia dos brasileiros. Ele não entendeu. Pudera! Muitas pessoas não entendem, especialmente as que não gostam de política e apreciam a pizza, ou as que detestam pizza somente quando começam a perceber a política. Em um ou em outro caso, continuo fiel ao bolinho de arroz. Em Roma se chama "supplì".


P. S. "Supplì" é claramente uma abreviação, uma característica do dialeto romanesco, que muitas vezes corta o final das palavras. Ao contrário do que muitos pensam, "supplì" não é abreviação de "suplício", embora os romanos tratem a comida e a gula de forma muito irônica. Na realidade é o início da palavra "suplemento", pois bolinho de arroz não enche a barriga de ninguém, mas já é um bom começo. Política também não enche a nossa barriga, mas pode causar a nossa ruína. E a pizza? Depende. Quando a política deixa tudo mal explicado, a pizza costuma ser bastante indigesta.

Sobre o autor

Gislaine Marins

Doutora em Letras, tradutora, professora e mãe. Autora de verbetes para o Pequeno Dicionário de Literatura do Rio Grande do Sul (Ed. Novo Século) e para o Dicionário de Figuras e Mitos Literários das Américas (Editora da Universidade/Tomo Editorial). É autora do blog Palavras Debulhadas, dedicado à divulgação da língua portuguesa.

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