Natal, o ato revolucionário de Deus.
Todos os anos, no mês de dezembro, a humanidade prepara-se para a festa de Natal. Enfeitam-se as casas, iluminam-se os quarteirões comerciais, tocam-se músicas natalinas, frequentam-se as lojas, compram-se presentes, fazem-se festas no local de trabalho, vestem-se de Papai Noel, participa-se da Missa, tem-se o coração em festa, fica-se mais sensível à família, à amizade, à pobreza, à paz e ao amor. Natal é a ocasião das reconciliações, dos perdões, das trocas, das partilhas, escreve o teólogo. E isto é Natal? Natal do Senhor?
Para responder a interrogação é preciso voltar para as origens do Natal e ver seu significado. A origem desta festividade é inicialmente natural e pagã. No Hemisfério Norte, nessa época do ano ou dezembro, no solstício do inverno a noite leva vantagem sobre o dia, é mais longa. No Império Romano, tinha-se o hábito de celebrar o sol nascente, o solis invecti, na noite de 24 e 25 de dezembro, para significar o renascimento da luz. Nessa época os dias começam a se alongar até o solstício do verão, evento astronômico em que a Terra recebe maior quantidade de raios solares, tornando os dias mais longos que a noite. Em sua origem natural e pagã, Natal refere-se aos dias mais longos, portanto, com mais luz e luminosidade.
Nos textos bíblicos e na tradição bíblica Natal também faz referência a luz, mas não a solar da estação do ano. Séculos antes do nascimento de Jesus, o profeta Isaías anunciava ao povo de Deus ou aos hebreus que vivia como escravo na Babilônia, a chegada da luz: “O povo que andava na escuridão viu uma grande luz, para os que habitavam as sombras da morte uma luz resplandeceu” (Isaías 9,1). O povo hebreu permaneceu séculos, entre liberdade e escravidão, caminhado e acreditando que iria surgir para eles um novo momento de sua história, do ser luz de todos os povos.
Os cristãos são levados a contemplar a luz da humanidade no nascimento de Deus, feito carne humana (João 1,14). O Cristo a luz verdadeira dos homens que brilha nas trevas (João 1,4-9). Os quatro evangelistas, com suas peculiaridades literárias narram o Natal de Jesus de Nazaré a partir de sua Páscoa ou do seu Mistério Pascal. Contemplam a Ressurreição de Cristo como um nascimento para a vida nova. Aquela que Jesus havia anunciado: “Eu sou a luz do mundo. Quem me segue não andará nas trevas, mas terá a luz da vida” (João 8,12). Ele em sua ressurreição é a luz da nossa estrada. Para os evangelistas a festa do Natal nasceu da Páscoa (Marcos 16,1-8).
Porém, para o Evangelista Lucas o nascimento de Filho de Deus acontece numa imensa situação de pobreza. O Criador do universo escolheu a pobreza, para manifestar Sua grandeza. Escolheu a fragilidade de um menino, de uma criança, com toda a vulnerabilidade que comporta esta fase da vida (Lucas 2,1-14). Uma criança nascida de uma família não convencional, que nasce numa manjedoura de animais, porque era demasiado pobre para nascer em outro lugar.
Lucas com sua compreensão dos fatos narra o Natal do Senhor com muitos elementos teológicos. No nascimento do Jesus há o elemento humano, exemplar, modelo, Maria, a jovem humilde e cheia de graça, e José, o carpinteiro justo e fiel, escolhidos para serem parceiros desse maravilhoso evento, o da luz (Lucas 1,26-38). Há os pastores em sua simplicidade, categoria dos excluídos e os desprezados da época que recebem a mensagem divina. Também há o elemento cósmico, a estrela no céu que apontava algo grandioso, o Criador do universo convoca os pastores a testemunhar o nascimento do seu Filho, da manjedoura contemplaram a chegado do Salvador da humanidade, a luz que brilha nas trevas (Lucas 2,8-20).
No nascimento do Senhor há ainda o elemento histórico e cultural que acontece em Belém (Lucas 2,4), que fica às periferias do domínio do Império Romano, pequena cidade que se tornou palco do extraordinário, da luz do mundo. Ao escolher Belém, cidade desprezada e insignificante até para o poder opressor, local de nascimento de Seu Filho, Deus indica que sua presença não requer pompa, luxo, grandiosidade, mas um coração receptivo e uma alma alegre em esperança e vida.
O nascimento de Jesus em Belém não é apenas uma história bonita, mas uma realidade que deve continuar presente na vida da humanidade (Lucas 2,15). Hoje, a pequena cidade de Belém com menos de trinta mil habitantes vive seus piores dias. Desde 1967, mesmo estando dentro da fronteira palestina, na Cisjordânia, região onde fica Belém, é ocupada pelo Estado de Israel e suas tropas de soldados. Os israelenses tomaram a cidade na Guerra dos Seis Dias, que aconteceu entre 5 e 10 de junho de 1967. Belém, em árabe quer dizer “Casa da Carne”; em hebraico, “Casa do Pão”. A “Casa da Carne” e a “Casa do Pão” faz referência a pessoa de Jesus que foi transformada em campo de pobres e de opressão. A “Casa” ou cidade hoje está ferida com a chaga da violência, da guerra, da invasão das forças militares.
Resta-nos neste Natal, rezar para que Deus nasça novamente na terra da Palestina e de Israel, local onde as pessoas, sobretudo, as crianças estão sob mísseis de guerra e obrigadas a ir à rua com uma pequena panela suplicando um pouco de sopa oferecida por pessoas de bom coração. Este território do oriente médio e outros territórios o povo está envolvo em trevas, escuridão e a sombra da morte ronda diariamente. A estrela guia de Belém, precisa brilhar novamente urgentemente sobre o território da Palestina, Israel e o periférico.
O Natal do Senhor precisa ser atual e ressignificado. O Natal do Senhor com mais de dois mil anos deve ressurgir novamente, não pode ficar preso às lembranças do passado, nem ficar nas garras da magia e do comércio. O Natal do Senhor, evento da estrebaria, rejeitou toda discriminação às mulheres, aos pobres, aos homossexuais, aos divorciados, aos recasados, as prostituas, aos mendigos, as ocupações de territórios nacionais, as guerras.
Para muitos a figura de Jesus em seu Natal leva pensar em festa e confraternização. Para outros a pessoa de Jesus em seu Natal é tempo de renovação da vida e dos bons propósitos. Para outros o Natal do Senhor é ato que subverte a regra do poderio humano, pelo qual, Deus indica um novo rumo, do amor ao ser humano e que a vida é direito.
Mesmo que transcenda a qualquer conceito ou definição humana, Natal é um ato revolucionário de Deus. O ato revolucionário Deus jamais apaga sua Luz, seja em qual for tempo, contexto e época da civilização humana. Viva o Natal de Deus como fato que implica um ato humano de acolhida em seu maior sentido!
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