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Merecedores do perdão

Miguel Debiasi

Em continuidade à reflexão anterior sobre perdão não merecido, agora ressalto o prejuízo da população decorrente das benesses do governo federal. A “Casa do Povo”, mais para a Casa VIP, o Congresso Nacional, foi capturada pelo interesse do mercado liberal. Nisto a política, enquanto ciência de organização e administração do bem comum ou do coletivo, foi banida da Casa VIP. Por aquilo que aconteceu e pelo que está em curso, Brasília é tudo, menos a “Casa do Povo”.

Em consequência do desvio da função ao comum ou à coletividade dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, o povo brasileiro tem sólidas razões para repugnar governos e políticos. Mas, esta repugnância é desejada pelo sistema, por assim colocar o Estado em função de interesses privados. A composição do Congresso Nacional já demonstra total repugnância ao sistema político. Em termos estatísticos 22,9% do Congresso é composto por parlamentares que representam servidores públicos, professores, policiais, etc.; 4,9% por bispos e pastores, atletas, cantores, etc.; 1,5% por agricultores; 28,5% por profissionais liberais como advogados, médicos, engenheiros, etc.; 42% por empresários e latifundiários. Nisto tem-se uma compreensão do aval às medidas provisórias, reformas, projetos e deliberação das verbas públicas.

Está em pauta no Congresso Nacional a mudança da Medida Provisória referente à anistia da Dívida Ativa da União. Se aprovada causará forte impacto no orçamento anual. Segundo o secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, com base em alguns cálculos da Receita Federal, “a cada seis reais que o governo poderia obter sobrará apenas um”. Em razão de que o governo concede o perdão de cinco reais que serão embolsados pelos próprios caloteiros. Com isso abre-se um déficit público, um rombo nas contas do governo, e quem paga isto é o povo com aumento de impostos, taxações de produtos como combustível, energia, comunicações, etc.

O assombro da mudança é a comissão que aprovou o relatório para o perdão da Dívida Ativa com a União. A comissão é composta por 50 membros, sendo que entre os titulares 22 estão com o nome na Dívida Ativa da União. Estes devem "apenas" 212 milhões de reais. Entre eles, dois deputados: Newton Cardoso Jr., do PMDB de Minas Gerais, e Alfredo Kaefer, paranaense do partido PSL. Newton Cardoso Jr. tem uma dívida de 53 milhões de reais e foi o relator do texto que deve ser aprovado pelo plenário do Congresso. O deputado Kaefer deve 32 milhões. Com 22 membros da comissão devedores da União o texto a ser aprovado não poderia ser diferente, o perdão da dívida.

Com esse agravante moral dos senhores deputados, pasme ver um país afundado na maior crise econômica e política conceder perdão a quem não merece. Em qualquer país sério, um parlamentar devedor não votaria uma matéria desta natureza. Melhor dizendo, os devedores estão fazendo leis e aprovando em seu próprio benefício obtendo o perdão da dívida. Em contrapartida, para combater o rombo público, a Casa VIP retira direitos dos trabalhadores e aposentados e eleva impostos. O conhecimento dessas informações dos congressistas devedores é público, basta acessar o órgão federal e conferir a lista oferecida pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). Indignação com o perdão é o mínimo que se pode esperar da soberania nacional

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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