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Interpretação da Escritura (I)

Miguel Debiasi

O estudo sobre a Escritura Sagrada na sociedade contemporânea, especialmente na América Latina e no Brasil, tem se tornado cada vez mais sistemático. Em tempos de secularização e de globalização com perspectivas de enxergar e conduzir o mundo sob a ótica da economia, dos interesses dos grandes grupos financeiros, requer um novo olhar. Os estudos bíblicos, na atualidade, se tornaram o óleo quente capaz de estourar a pipoca da religiosidade e de asseverar mobilização significativa de pessoas e comunidades contra a exploração e a exclusão social.

É de compreensão geral que na atualidade há o ressurgimento da religiosidade. Novas igrejas surgem, transformando galpões e garagens em casas de oração. Na TV aberta programas religiosos são exibidos em horários nobres. Também cresce a venda de livros de autoajuda que abordam nas entrelinhas o cultivo da religiosidade. As ciências humanas e as sociais aplicadas estão edificando novos templos de atendimento. Tudo isto se relaciona com o aparente contraste entre secularização e religiosidade. Não se trata apenas de novas experiências e técnicas de cultivo do cristianismo, mas de um reconhecimento da coletividade de cultos religiosos que abrange a vida social e a cultura do povo.

A realidade contradiz o que os profetas do mercado pregavam, de que o novo milênio seria o fim da era do cristianismo. A religiosidade não está na clandestinidade, menos ainda condenada ao preconceito ou à ilegalidade das celebrações. Na análise do teólogo brasileiro Iuri Andrés Reblin “esse movimento religioso em pleno século XXI intriga especialistas e pesquisadores”. Diante desta nova realidade religiosa os teólogos se perguntam: Quais as religiões que atraem as pessoas? Por que as pessoas são atraídas para essas celebrações e eventos religiosos? O que elas estariam buscando? Que produto e cultura religiosa estão consumindo? Que Deus se está adorando? O que esta cultura religiosa está oferecendo?

Para investigar tudo isto a Teologia indica caminhos e respostas. Esta abordagem leva a dois elementos de discussão: a Teologia e o cotidiano. O primeiro, a Teologia é a interlocutora imprescindível do debate e do saber religioso. Segundo, o cotidiano é locus originário que constitui este saber. A relação entre Teologia e cotidiano é o caminho para entender a nova realidade religiosa do continente latino-americano. Então, a Teologia não é apenas ciência eclesiástica, de dogmas, mas de pensar a vida como acontecimento histórico. Ela mergulha na vida de cada indivíduo, em sua história, nos encontros e desencontros, nas ambiguidades. O cotidiano é o palco onde a vida acontece com suas alegrias e desesperos. É o desenrolar da vida humana onde atores e atrizes atuam no desafio de cada dia. É neste palco que a Sagrada Escritura deve ser interpretada. Na próxima crônica acompanhe a continuidade do assunto.

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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