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Eu compartilho, portanto, eu existo

Miguel Debiasi

Vivemos num mundo em que a experiência face a face ficou em segundo plano nas relações interpessoais. Via meios eletrônicos é fácil fazer amigos. Através deles constituímos relações com pessoas até então desconhecidas e distantes. Nos ambientes virtuais a comunicação com qualquer pessoa é fácil, mas a experiência do encontro real torna-se quase impossível e inviável. Por conta da opção virtual as novas gerações também sofrem seus estresses, desânimos e conflitos. Eis um desafio: dosar o tempo conectado.

Estudos mostram que os usuários começam a manifestar saturação dos meios eletrônicos. Recentemente foram divulgadas pesquisas realizadas pelas empresas dos EUA Social Bakers e ComScore, que analisaram o movimento dos usuários em redes sociais. Nos EUA, a pesquisa aponta que 1,7 milhões de usuários do Facebook deixaram o site, número equiparado aos que abandonaram a rede social na Inglaterra. Com a saída de usuários, especialistas estudam as causas que possam ter levado à saturação.

No Brasil, 65 milhões de pessoas usam o Facebook. Representam 35% da população. A pesquisa mostra que no país o Facebook está em pleno potencial de expansão. O fator favorável para isto é que 67% da população brasileira usa as redes sociais. Segundo a pesquisa, em alguns países o Facebook já estaria disputando espaço do Twitter e Google. Uma considerável porcentagem da população mundial passa bom tempo diário conectada.

Esses dados são motivadores de reflexão. A tendência a ampliar o mundo virtual é irreversível e irresistível. Seja qual for o grau de formação as pessoas podem aprender a estabelecer uma conexão eletrônica. Aos poucos todos vão entrar na era virtual. As redes sociais são um fenômeno de utilidade e de satisfação. É um espaço que corresponde ao desejo, à satisfação humana, ainda que virtualmente.

As novas tecnologias criam também uma nova antropologia. Um novo homem nasce das redes sociais. Basta acessar uma rede social e é possível ver milhões de pessoas felizes. Uma mais feliz que a outra. Contudo, nesses ambientes não existe o encontro, apenas a vitrine. No máximo, os contatos virtuais preenchem lacunas existentes por falta de vínculos reais. Com isso, tem-se uma sensação que satisfaz enquanto se derrota ilusoriamente a solidão.

Eu compartilho. Portanto eu existo. Este é o tema da animação que pode ser vista no YouTube, The innovation of Loneliness (A inovação da solidão), inspirado na obra da psicóloga americana Sherry Turkle Alone Together: Why We Expect More from Technology and Less from Each Other (Sozinhos Juntos: porque esperamos mais da tecnologia e menos uns dos outros), ainda não publicado em português. O livro de Turkle é uma chamada para acordarmos para o fato de que nosso uso da tecnologia alimenta níveis preocupantes de isolamento, nos deixando sem capacidade de distinguir entre uma verdadeira conexão humana e a comunicação digital. Como dizia no início, é um desafio dosarmos o tempo conectados.

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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