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Aliança global contra a pobreza e a fome

Miguel Debiasi

Desde a Idade Antiga, a fome e a pobreza já eram uma questão de conflitos e disputas entre povos. Em época contemporânea com todos os avanços educacionais, tecnológicos e desenvolvimentos agrícolas, industriais e comerciais, a fome e a pobreza são questões que persistem e para sua superação implicam nas políticas nacionais e internacionais. Fome e pobreza também são questões de fé, acarretam a realização do Reino de Deus.

O relatório da Universidade de Oxford, divulgado em 11 de julho de 2023, sobre o Índice Global de Pobreza Multidimensional (IPM), apresenta que 1,1 bilhão de um total de 6,1 bilhões de pessoas, pouco mais de 18% da população vivem em pobreza multidimensional aguda em 110 países. A África Subsaariana com 534 milhões e o Sul da Ásia com 389 milhões, abrigam aproximadamente cinco em cada seis pessoas pobres. A África Subsaariana  corresponde à parte do continente africano situada ao sul do deserto do Saara. É chamada de África subsaariana por estar ao sul do Saara e é constituída de quarenta e oitos países, cujas fronteiras resultaram da descolonização.

A fome afeta no mundo 811 milhões de pessoas, concentrando-se principalmente nos continentes africano e asiático. Segundo o relatório, a fome é causada por diversos fatores, como a pobreza, as desigualdades sociais, crises econômicas, os conflitos e guerras civis e internacionais, má distribuição de alimentos e o manejo inadequado dos recursos naturais. Somam-se a essas causas a crise climática e os fenômenos como secas severas e inundações. As consequências da fome no mundo vão desde subnutrição até a morte por desnutrição.   

O filósofo e escritor crítico francês Jean-Paul Sartre (1905-1980), escreve: Avoir faim, c'est deja vouloir être libre, traduzindo: Ter fome já é querer ser livre. Houve um tempo em que as pessoas lutavam pela liberdade. Lutavam pela liberdade proporcionadas pelas democracias, direitos, tolerância religiosa, igualdade de gênero, fugir das guerras, migrar para outros países, possuir bens.

Em nosso tempo, parece-nos que vivemos uma liberdade mais abstrata que concreta, porque milhões de pessoas estão submetidas aos grilhões de opressão. Diga-se, estão encarcerados, prisioneiros da situação de guerra, desemprego, pobreza, analfabetismo, insegurança social. De outra parte, acreditar numa liberdade que não passa de uma mistificação criada pela sociedade burguesa, como da Revolução Francesa (1789-1799), sob lema liberdade, igualdade e fraternidade, seria muito ingênuo de nossa parte.

A realidade mundial diz-nos que a liberdade não pode ser um ideal abstrato. Ela precisa ser concreta. Uma grande parte da população mundial não vive em sociedades ricas. Há países e numerosa multidão mergulhada na pobreza e a má distribuição da riqueza contradiz o ideal de igualdade da Revolução Francesa. Em muitas regiões do mundo a guerra explode como um vulcão que cospe fogo devastador sem a mínima piedade e compaixão das vítimas inocentes. A liberdade de viver em paz lhe foi cerceada por tiranos e autoridades inumanas. E, a igualdade e a fraternidade foram engolidas pelo materialismo sórdido.

Mas o que significa a frase de Jean-Paul Sartre: Ter fome já é querer ser livre. Um pai de família mal remunerado provavelmente não conseguirá saciar a fome de sua família. Uma mãe de família mal remunerada provavelmente não consegue dar o melhor para seus filhos. Um cidadão sem emprego provavelmente no final do dia não terá com que saciar sua fome. A fome provoca todo tipo de desconforto para qualquer ser humano, como do medo, adoecer, morrer, abandono e exclusão social, ser tratado como indigente, sub-humano.

Para Jean-Paul Sartre a fome é muito mais que uma exigência ou de algo que preencha a barriga. Todo ser humano vive em sociedade e deseja estar nela da forma mais digna e democrática possível. A fome e a pobreza insultam a dignidade humana. Em contrapartida, a fome e a pobreza demandam aumento do salário, distribuição de renda, trabalho, cultura, para que a pessoa possa se sentir digna e livre. Assim, para Jean-Paul Sartre não basta apenas alimentar os desejos do estômago e da barriga, mas alimentar-se para ser livre.

O relatório global de insegurança alimentar da ONU, divulgado em julho de 2024, na reunião dos líderes do G20 no Rio de Janeiro, ressaltou que o Brasil ainda enfrenta desafios para sair do Mapa da Fome. Nesta mesma data foi lançada pelo presidente da República a proposta de uma Aliança Global contra a Pobreza e a Fome. Proposta que fora levada ao Banco Mundial e ao Banco Interamericano (BID), posteriormente, no dia 24 de setembro foi apresentada na 79ª Assembleia Geral da ONU, tendo uma afável receptividade da parte dos diplomatas mundiais.

 O Brasil e vários países que tiveram participação na 79ª Assembleia Geral, também defenderam a ideia de criar reformas na própria ONU e de um novo organismo que possa dar eficiência a aliança global concentrando fundo e capacidade financeira, com a participação de bancos, setores públicos e privados. Enquanto as autoridades nacionais buscam criar novos organismos e alianças globais é preciso que cada país faça o dever de casa.

No caso do Brasil, o relatório da insegurança alimentar da ONU apontou a perspectiva de queda do quadro de fome do país, com possibilidade até 2026 sair do Mapa da Fome. Conforme IBGE, o Brasil ainda tem 8,7 milhões de pessoas que passam fome. Da parte dos poderes públicos, o ministro do desenvolvimento social, Wellington Dias, manifesta otimismo quanto à significativa redução da fome no Brasil em 2023.  

A superação da pobreza e da fome a nível mundial depende muito de uma vontade e decisão política dos governantes. Isso implica ter organismos internacionais comprometidos com a causa e que deem atenção aos últimos. Isto significa, captação de recursos para as políticas públicas.

A fome e a pobreza não são abstratas, mas realidade concreta que leva milhões de seres humanos à morte precoce. Uma aliança global contra essa situação só traz benefícios a humanidade inteira, torna concreta a mensagem do Evangelho de Jesus Cristo.

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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