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I love you, Brazil

Gislaine Marins

Meu Amor, sei que você não é puro. Quantos, antes de mim, cobiçaram as suas matas virgens sonhando o ouro das suas terras? Juraram fidelidade, trocaram miçangas, mataram em nome do seu amor. Mas você sabe, querido, isso não é amor, é violência.

Se você fosse puro, eu o chamaria de Peri e eu seria a sua Cecília para sempre. Porém, você sabe, e eu também, que a vida não é um romance.

Alguns perderam a cabeça por você. Hoje são chamados de heróis. Queria namorar um economista que contasse, sussurrando no meu ouvido como juras de amor no escuro da noite, quantos quilos de ouro custaram a cabeça de um dos seus mais ilustres amantes. O amor é cego: eu, que podia namorar e casar com um economista, descobrir os segredos das contas e dos contos que alimentam a paixão, fui capturada pelo feitiço da sua exuberância nativa. Quem se apaixona pelo Brasil conjuga o verbo sofrer.

Você não é puro, meu bem. Sei que muitos prometem mundos, fundos e nióbio, e sei que você é bobinho, acredita em tudo. É por isso que sofre por amor, mais do que eu, que amo você à distância. Você jura ser Iracema e acaba sendo tratado como a polaquinha dos cabarés de São Paulo. Se você fosse esperto, meu docinho, não seria vítima como Geni, seria altiva como Judite. Cortaria a cabeça do rei - simbolicamente, seu grande tonto -, como fazem os rapazes sem coração quando riscam o nome das moças das suas agendas. Mudaria de agenda, até. Se eu fosse você, corresponderia ao meu amor desinsteressado. Começaria uma vida nova, depois de esclarecer a todos os que querem enganá-lo, e diria: mudou a música! Agora eu quero um amor sincero!

Eu diria isso, você não acha bom, meu Brasil?

Tesouro, eu não acredito que você esteja feliz. Não acredito que você já tenha esquecido as promessas de ter filhos fortes, robustos, com um grande futuro. Como você quer que as crianças cresçam, se não têm universidade, se a saúde delas está ameaçada e se o futuro delas não possui nenhuma garantia? Que espécie de pai desalmado que você quer ser? Brasil, você merece mais do que a fama de progenitor que abandona a sua prole. Nós, mulheres, somos fortes, mas não somos tudo.

Meu dengo, eu não sou a única que sente saudade. Não sou a única que chora nas tardes melancólicas do outono que se aproxima vendo você tão distante. Quem ama o Brasil tem sangue de Uirapuru: sabe voar para longe e entoar o seu canto triste, que faz os outros pássaros calarem. Sabe ser triste e sofrer, mas não esquece o que o amor significa.

Amor é a única coisa que brota e renasce dentro de nós. É a única coisa que desata os nós e sela alianças. O amor é tudo, querido.

I love you, Brazil. Deixe que eu diga isso nessa língua que capturou os seus sentidos e é tão diferente do nosso sentir. Todos têm o seu dia de hipnose. E todos acordam um dia: com um beijo, com um balde de água fria ou com o despertador. E você há de acordar também. E verá que ainda estou aguardando que esse país se transforme no mundo dos nossos sonhos.

Sobre o autor

Gislaine Marins

Doutora em Letras, tradutora, professora e mãe. Autora de verbetes para o Pequeno Dicionário de Literatura do Rio Grande do Sul (Ed. Novo Século) e para o Dicionário de Figuras e Mitos Literários das Américas (Editora da Universidade/Tomo Editorial). É autora do blog Palavras Debulhadas, dedicado à divulgação da língua portuguesa.

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