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Hoje sabemos seus nomes

Miguel Debiasi

O artigo 2º da Constituição Federal (1988), deixa claro que são três Poderes Da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Os três poderes têm autonomia para atuar. Até poucos anos não havia uma valorização do poder Judiciário, sequer conhecíamos os nomes dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Essa realidade mudou. Essa mudança foi negativa ou positiva?

O Supremo Tribunal Federal é o órgão de cúpula do Poder Judiciário e a ele compete, precipuamente, a guarda da Constituição, conforme definido no Artigo 102 da Constituição da República. É composto por onze Ministros, todos brasileiros natos. Como órgão de instância máxima do Poder Judiciário, atuando como defensor da Constituição Federal cabe: julgamento de casos de constitucionalidade e inconstitucionalidade e atuar como última instância de recurso jurídico. As decisões podem ser monocráticas - decisão de um Ministro ou colegiadas - decisão de uma das Turmas ou do Plenário. As Turmas, a primeira e a segunda do Supremo Tribunal Federal, são compostas por cinco membros com presidência própria.

A justiça é a mais importante virtude de uma Nação, do Estado, que está na raiz das outras. Ninguém pode exercer sabiamente sua cidadania sem ser justo. Como escreve o poeta e filósofo brasileiro Jayme Paviani (1940) “ninguém pode ser sábio, corajoso e moderado sem ser justo”. Os filósofos gregos, como Sócrates (470-399 a.C.) que pensaram na forma e na estrutura do Estado ideal, argumentaram pela necessidade da virtude da justiça. Para chegar ao Estado ideal será preciso encontrar a virtude da justiça em cada cidadão. Cabe ao Estado despertar essa virtude em cada cidadão de geração em geração.

Em suas obras A República e as Leis, Platão (428/427-348/347 a.C.), constrói conceitos de virtude. O bem da cidade e da vida coletiva é fruto da virtude do cultivo (educação) das almas individuais. A alma se manifesta em cada pessoa que deve ser educada pela racionalidade e preservada por mecanismos externos, como as leis, as regras, os preceitos. O papel da educação é conter as paixões que são ameaçadoras da alma e que se não forem controladas, podem conduzir ao desequilíbrio, à maldade, à violência, à desarmonia social, comenta o professor Gerson Pereira Filho.

Durante o século XV se formaram os primeiros Estados na Europa Ocidental, os chamados Estados Modernos. O filósofo inglês John Locke (1632-1704) com Dois Tratados Sobre o Governo (1689), escreve: o Estado social e democrático de Direito, é uma organização governamental, pela qual, o indivíduo tem a garantia de seus direitos fundamentais, a defesa da justiça social e acesso aos serviços de saúde, educação, transporte, assistência e segurança.

Na Era Contemporânea, os Estados apesar de possuírem governos com princípios políticos distintos, são organizações públicas que tem como base a ordem social, política e econômica da nação. Esta organização e ordem, obviamente, interfere diretamente na vida de seus cidadãos, no sentido positivo, educando-os para a virtude da justiça.

Mas historicamente é o projeto político de uma pólis ou Estado ideal apresentado e defendido por Platão em A República, que tem fundamentado todas as discussões acerca da possibilidade da prática de uma sociedade justa. Para Platão só existe o Estado amparado na justiça, enquanto virtude ética e social. A justiça é o princípio que influencia diretamente e indiretamente a história da humanidade.

Sócrates conceitua a justiça como alma da pólis ou Cidade-Estado e que pode ser dividida em três partes: razão, coragem e temperança. A razão é a busca pela verdade através da inteligência e do poder reflexivo. Coragem, a segunda, é a proteção dos corpos, a arte da guerra. E, a terceira, temperança para conduzir os desejos da carne. Para Sócrates, a justiça é a alma da cidade e pode ser tripartida, porque todos somos racionais, corajosos e desejosos.

A cidade e Estado justo, para Platão, é cada indivíduo, de acordo com sua maior aptidão da alma, ocupar seu lugar dentro da pólis. Aquele com maior sabedoria deve governar a cidade, o Estado. O mais corajoso irá compor o exército. O temperado deve trabalhar para o bem da cidade ou Estado. Justo é aquele que exerce seu lugar na pólis dentro de sua aptidão, desenvolvida e educada. A virtude da justiça é aquela que dá equilíbrio, ética e social, que torna a cidadania plena.

A pesquisa do Instituto Datafolha, divulgada em dezembro de 2023, mostra o que pensam os brasileiros do Supremo Tribunal Federal. Ouvindo 2.004 eleitores em 135 cidades do país, para 38% dos brasileiros o Supremo Tribunal é reprovado contra 27% de aprovação. O Datafolha vem monitorando a opinião pública sobre o Supremo Tribunal Federal desde dezembro de 2019, período marcado por uma série de controvérsias e confrontos com o Congresso Nacional.

Para os analistas de pesquisas de opinião pública, as tensões entre Supremo Tribunal e Congresso Nacional se intensificaram no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. A causa foi a campanha do ex-presidente contra o sistema eleitoral e o voto eletrônico, a massiva divulgação de fake News, de impor uma pauta de temas polêmicos na política e campo social, a tentativa de implodir os três poderes que culminaram com os atos de antidemocráticos de 08 de janeiro. Este cenário sociopolítico construído propositadamente levou a instalação de um inquérito das fake News e dos atos antidemocráticos, aumentando a tensão entre Supremo Tribunal Federal e políticos de extrema direita, que são uma significativa parcela no Congresso Nacional.

Para haver um Estado mais justo e para que a virtude da justiça esteja em cada cidadão depende muito do trabalho dos três poderes da nação. As decisões do Supremo Tribunal Federal ainda que não agradem a uma parcela do Congresso Nacional, elas se justificam pela natureza constitucional e pela realidade. Obviamente, nos permitem que façamos uma reflexão sobre o teor das mesmas.

Outrora, sequer conhecíamos os nomes que compõem a Suprema Corte. Hoje, acompanhamos cada decisão tomada e podemos emitir juízo de valor. É claro que o juízo de valor credível supera os fatores culturais dominantes, sentimentais e ideológicos. Enfim, é positiva a mudança porque podemos acompanhar e refletir de forma crítica as decisões dos três poderes, assim, desenvolver a virtude da justiça.

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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