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Você tem medo de quê?

Vanildo Luiz Zugno

Pesquisa realizada no segundo semestre de 2019 pelo Instituto Ipsos – um dos mais conceituados do mundo – revela que a violência, a saúde e o desemprego são as três maiores preocupações da população brasileira. Das três, a violência, com 47% de indicações, aparece em primeiro lugar.

Pesquisas, claro, medem sempre percepções. E, percepções, nem sempre refletem o mundo real. Por isso sempre é bom checar esses dados com outros e ver se eles têm uma justificativa plausível ou é fruto de sensações muitas vezes influenciadas pela mídia que busca audiência através da exploração da violência.

Quando fazemos isso, infelizmente, constatamos que a pesquisa tem base real. O Brasil é um dos países do mundo onde mais jovens são mortos de forma violenta. A cada quatro minutos, uma mulher sofre algum tipo de violência física no Brasil. Nos últimos 12 meses, 1,6 milhão de brasileiras foram espancadas ou sofreram tentativa de estrangulamento, enquanto 22 milhões (37,1%) de brasileiras passaram por algum tipo de assédio. A cada duas horas, um feminicídio é cometido. E, o que é pior, boa parte dessa violência contra as mulheres acontece dentro de suas próprias casas e é cometida por um familiar.

Somos campeões mundiais em violência contra pessoas LGBTs. A cada 24 horas, um homicídio é cometido tendo como única razão, a homofobia.

E, para piorar, temos a polícia mais violenta do mundo. E, violenta, de maneira especial, contra os pobres e negros. 73% das vítimas de violência policial são pretos ou pardos.

Poderíamos continuar com números sobre a violência que, desgraçadamente, abundam e dão sustentação aos dados da pesquisa. Mas, duas perguntas devem ser feitas e precisam de respostas. A primeira é sobre a origem da violência e, a segunda, é sobre como superá-la.

À primeira pergunta, todos os estudos indicam na mesma direção: a violência é fruto da desigualdade social. Quanto mais desigual uma sociedade, maior é a violência que nela campeia. Sendo o Brasil uma das sociedades mais desiguais do mundo, é consequência que seja uma das mais violentas. Reprimir a violência fruto da desigualdade só gera mais violência. É o que estamos constatando. Seria muito mais barato e eficaz reduzir a desigualdade social do que aumentar a força policial e o encarceramento da população. Mas isso requer uma mudança de mentalidade e a aceitação, por parte da minoria que tudo tem, de ceder um pouco para aqueles que nada ou quase nada tem.

E aí já há uma indicação para a segunda questão, a de como superar a violência. Para alcançar esse objetivo, é preciso uma mudança cultural. Ela inclui, por um lado, a superação da mentalidade patriarcal escravocrata, ainda profundamente arraigada na sociedade brasileira, de que a desigualdade é natural e de que alguns podem ter tudo enquanto outros não precisam ter nada. E, junto com isso, a mentalidade do dono de escravos e de seus feitores de que violência só se combate com mais violência.

É preciso superar a lei do “olho por olho e dente por dente” e caminhar na direção do indicado pelo Profeta da Paz de que o amor ao inimigo é o único caminho para a superação da violência. Quando amado, o inimigo deixa de ser visto como tal e passa a ser nosso próximo, aquele com quem compartilhamos o caminho, a cidade, a mesa e a comida. E aí toda violência acaba.

Sobre o autor

Vanildo Luiz Zugno

Frade Menor Capuchinho na Província do Rio Grande do Sul. Graduado em Filosofia (UCPEL - Pelotas), Mestre (Université Catholique de Lyon) e Doutor em Teologia (Faculdades EST - São Leopoldo). Professor na ESTEF - Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana (Porto Alegre)."

 

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