Você está ouvindo
Tua Rádio
Ao Vivo
14:00:00
Em Alta
18:00:00
 
 

Uma Igreja sinodal, ainda é possível!

Miguel Debiasi

O Papa Francisco propôs a Igreja a prática da sinodalidade. A proposta foi lançada maio de 2021, mês em que aconteceria a XVI Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos e que foi transferida para outubro de 2023, devido a pandemia. O processo preparatório da Assembleia Geral do Sínodo terá como tema: “Por uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão”. A sinodalidade, ainda que seja um elemento inerente a natureza da Igreja, é um processo instigante e desafiante a ser percorrido pelos cristãos no terceiro milênio.

A atualização da Igreja vem acompanhada da renovação da Teologia. Igreja e Teologia é uma via de mão dupla, há um dar e um receber simultaneamente. O acontecimento mais importante para a Teologia e a Igreja Católica no século XX foi o Concílio Vaticano II, inaugurado pelo papa João XXIII em 1962 e encerrado por Paulo VI em 1965. A grande contribuição do Concílio foi que a Teologia e a Igreja, foram desafiadas a luz das Sagradas Escrituras, interpretar os “sinais dos tempos” ou as “novas realidades terrenas” e propor respostas pelo aggiornamento, ou a atualização da vida cristã. O Concílio provocou a Teologia e a Igreja frutificar em seu trabalho com concepções mais renovadas e práticas eclesiais constituídas à luz do Evangelho. Nessa trilha propor caminhos de evangelização do ser humano moderno sem negar sua consciência, liberdade e perspectivas sociológicas, filosóficas, psicológicas e outras.

É de consenso para os bispos que o século XX entrou para a história da Igreja “como o século da eclesiologia” pela realização do Concílio Vaticano II que contou com a participação de renomados teólogos católicos e de outras forças. Entre os teólogos mais representativos são Contran-Marie Garrigou-Lagrange (1877-1964), a voz da teologia escolástica tradicional; Pierre Teilhard de Chardin (1881-1955), conhecido como o paleontólogo que buscou reconciliar a visão evolutiva do universo e com a concepção espiritualista; Romano Guardini (1885-1968), jesuíta alemão, articulou a relação da Igreja com a cultura contemporânea moderna, a ponto de ser conhecido como o “maior pedagogo dos nossos tempos”; Marie-Dominique Chenu (1895-1990), pela sua pesquisa sobre a história da teologia ficou conhecido como “a voz da teologia das realidades terrenas”; Yves Congar (1904-1995), dominicano francês que contribuiu com a questão da relação entre cristianismo e a história para a construção de uma teologia do ecumenismo; Henri de Lubac (1896-1991), jesuíta francês; Karl Rahner (1904-1984), jesuíta alemão; Hans Urs Balthasar, (1905-1988) sacerdote suíço; Eduard Schillebeecks (1914-2009), dominicano belga; Johannes B. Metz (1928-2018), sacerdote alemão. Estes teólogos em muito contribuíram para a renovação da teologia e da prática eclesial.

Na lista de significativos representantes do Concílio Vaticano II há outros excelentes teólogos, bispos e sacerdotes. Mas, seria um erro ignorar a contribuição dos movimentos eclesiais, pastorais e as comunidades de base que buscavam renovar a Igreja e a vida cristã pela aproximação com o ser humano moderno. Entre os movimentos os mais relevantes são o bíblico, catequético, litúrgico, teológico. De mais a mais, as próprias realidades humanas forçaram a Teologia e a Igreja a pensarem uma nova relação entre católicos e outras confissões cristãs, entre católicos e ateus, entre fé e vida, fé e ciência, fé e política, entre tradições e as concepções atuais e outras. Na força destes movimentos, Teologia e a Igreja, percebem que nos novos sinais dos tempos e nas novas realidades humanas surgiu a necessidade de abrir as fronteiras do pensamento teológico e da ação eclesial.

Na avaliação do teólogo Karl Rahner, escolhido pelo papa João XXIII, para integrar o primeiro grupo de 195 peritos conciliares, o Concílio Vaticano II abriu as portas da Igreja e da Teologia. O Sínodo será uma oportunidade de o Papa Francisco tomar conhecimento de como está acontecendo o processo de renovação da Igreja universal e local, da vida cristã como indica o Vaticano II. Do processo preparatório da Assembleia Geral do Sínodo virá um farto material de todos os continentes sobre a caminhada da Igreja no terceiro milênio. Este subsídio a ser entregue ao Papa virá das três fases preparatórias. Entre outubro de 2021 a agosto de 2022 acontece a fase “da escuta” do povo de Deus da Igreja local, portanto, a diocesana e a paroquial. A segunda fase é da Igreja do continente que elaborará um documento de trabalho a partir dos relatórios “da escuta” realizada na base, da comunidade diocesana e paroquial. A fase definitiva acontece a nível da Igreja universal, com a Assembleia Geral dos bispos do Sínodo em outubro de 2023. Certamente, o Papa poderá ter uma visão global da caminhada da Igreja que lhe permitirá indicar novos passos para a vida cristã.

No lançamento do Sínodo o Papa Francisco afirmou que o caminho da Igreja do terceiro milênio é o sinodal. O termo Sínodo ou sinodal significa “caminhar juntos”, ou estar juntos na caminhada cristã que expressa bem a natureza de Igreja Povo de Deus. Na atual conjuntura eclesial percebe-se que nem todos os líderes da Igreja caminham na proposta do Concílio, atualizada pelo Papa Francisco por meio de documentos, encíclicas, publicações, pregações e iniciativas. A comunhão sinodal é uma experiência e um projeto eclesial exigente, sobretudo para o clero. Também é visível que grande parte dos católicos não participam da missão Jesus Mestre e menos ainda se comprometem com seu projeto (João 14,6).

A sinolidade eclesial, o “caminhar juntos”, vai exigir despojamento de muitos que estão no seio de Igreja hierarquicamente estruturada e em função magisterial dos pastores. E, de outros despertar a sua vocação cristã, de serem sujeitos da evangelização à luz de Jesus o protagonista do Reino de Deus (Atos do Apóstolos 10,34). A Igreja “comunhão, participação e missão” – só pode acontecer quando a sinodalidade é vivida. Na visão dos teóricos da religião a Igreja está muito aquém ou do aggiornamento que propôs o Concílio Vaticano II. Por outro lado, é preciso ressaltar que a atualização da Igreja está em todas as pautas do pontificado do Papa Francisco. Ainda que seja uma caminhada exigente atualizar o Vaticano II, por parte de alguns líderes da Igreja, é indiscutível que o Papa Francisco acredita ser possível através da “Igreja dos pobres”, a “Igreja em saída”, a “Igreja sinodal” e com “os pastores com cheiro de ovelha” e outras iniciativas evangélicas.  

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

Enviar Correção

Comentários

Newsletter Tua Rádio

Receba gratuitamente o melhor conteúdo da Tua Rádio no seu e-mail e mantenha-se sempre atualizado.

Leia Mais