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As preocupações globais essenciais

Miguel Debiasi

 

A globalização ao reboque do mercado confere um significado novo ao mundo. Os benefícios da globalização são distintos e diversos aos países. Seus malefícios vão à mesma proporção. Em conjuntura geopolítica mundial de conflitos, é necessária a definição de critérios comuns à humanidade para que a globalização contribua com o desenvolvimento dos países e do mundo como um todo.

O Fórum Econômico Mundial de Davos, realizado em meados de janeiro em Genebra, Suíça, teve como preocupação central a questão climática, assunto também debatido nas edições anteriores. Evento de relevância mundial, os participantes de Davos na sua maioria eram empresários, aproximadamente três mil pessoas. Na comitiva brasileira constituída de muitos empresários, também participaram os ministros do governo federal: da Fazenda Fernando Haddad e do Meio Ambiente Marina Silva. No uso da palavra durante o evento, os ministros apresentaram a proposta de desenvolvimento econômico alinhada às questões sociais, ecológicas.

O Fórum Econômico Mundial fundado em 1971 por Klaus Schwab, economista e professor suíço-alemão, buscou criar um espaço de fomento à cooperação global em questões políticas, sociais e econômicas. Propriamente, o objetivo central de Davos era de reunir anualmente representantes dos setores público e privado para debaterem soluções para os problemas globais, visando à missão de estarem empenhados em melhorar o estado do mundo. À luz desse objetivo ao Fórum Econômico Mundial sobraram críticas à agenda do Davos 2023. A crítica refere-se ao debate de assuntos secundários como a questão climática, enquanto os grandes problemas de 2022 foram completamente ignorados: a situação da saúde pública agravada pela pandemia da Covid-19 e do empobrecimento dos países do terceiro mundo, resultado da crise econômica mundial.  

Na realidade o evento de Davos destina-se a 1% dos privilegiados do mundo. O Fórum de Davos tornou-se espaço de lobby, onde grupos e setores tentam influenciar as poderosas elites em decisões a nível de escala global. Em Davos criou-se um clima propício para empresas e mesmo países e regiões venderem seus conceitos e serviços ou atraírem investimento. O correspondente de economia do New York Times Peter Goodman, em seu livro Davos Man, apontou a contradição do evento Davos: pedir aos bilionários e às elites acusadas de causarem os maiores problemas do mundo para encontrarem formas de solucioná-los. Isto parece ser meio irônico, porque as agendas do Fórum Econômico Mundial de Davos são pertinentes às esferas econômicas e empresariais que estimulam interesses que se sobrepõem as problemáticas mundiais.

Mas não dá para ignorar que o Fórum de Davos é um espaço que há 50 anos debate questões em nível de escala global e que seus encaminhamentos contam feitos significativos para o mundo. Em 1988, um acordo assinado na reunião, conhecido como a Declaração de Davos, esteve na base do afastamento de um conflito armado entre Turquia e a Grécia. Em 1992, Nelson Mandela e o então presidente sul-africano Frederik Willem de Klerk fizeram a sua primeira aparição conjunta na cena internacional em Davos, um passo indiscutivelmente significativo para pôr fim ao regime de apartheid da África do Sul. Resultado que no ano seguinte, ambos ganharam o Prêmio Nobel da Paz. Em 2000, a Aliança Global para Vacinas e Imunização foi lançada em Davos e desde então tem melhorado o acesso a vacinas para milhões de pessoas. Desde a sua criação, já contribuiu com a vacinação de 760 milhões de crianças pelo mundo.

Seria certa ignorância não reconhecer os resultados dos debates fomentados pelo Fórum de Davos. Mas também seria ignorância não construir uma crítica à agenda e as preocupações centrais de Davos de 2023. Há lógica na preocupação com a questão climática que envolve toda humanidade. Os problemas climáticos estão ligados diretamente às formas de produção agrícola, econômica, tecnológica e energética. Também estão ligadas as questões sociais, a preservação da biodiversidade e muitas outras. Nessa compreensão, as colocações dos ministros do governo brasileiro em Davos, foram diferenciais ao pensar uma economia mundial e de desenvolvimento do mundo articulado aos cuidados ecológicos, a produção de energia limpa. E, sobretudo, uma economia com responsabilidade social de superação da fome e das desigualdades econômicas entre os países.      

Essas intenções são de muita valia para a humanidade. Mas o Fórum Econômico Mundial poderia ter colocado em sua agenda questões cruciais da humanidade, como a pandemia da Covid-19 e suas consequências para os países, sobretudo do terceiro mundo. A crescente situação de empobrecimento da população mundial, resultado da crise econômica do primeiro mundo. O prolongado conflito entre Rússia e Ucrânia e de outros países em guerra, reflexo e resultado da tensão política econômica e militar das potências mundiais. Um olhar para o fortalecimento de movimentos políticos de extrema direita identificados com as práticas do nazismo, fascismo e dos regimes ditatoriais que afrontam as democracias. Uma preocupação com os migrantes que cruzam fronteiras sob intensos conflitos e que não são socialmente acolhidos por países mais desenvolvidos. Por que não uma preocupação com a cultura, ciência, educação e desenvolvimento humano do planeta. Certamente, haveria outras problemáticas.

O Fórum Econômico Mundial é um espaço promissor e sua continuidade atravessará as décadas futuras. Sua importância e relevância estará associada à vontade dos participantes colocarem em pauta as problemáticas cruciais que envolve a humanidade e as suas formas de sobrevivência. Será preciso maior fidelidade ao seu objetivo primeiro, de reunir representantes dos setores públicos e privados, portanto, da humanidade inteira, para debater caminhos e soluções para os problemas globais e indicar a tarefa de melhorar o estado do mundo. Quanto maior a globalização e fortalecimento das relações mundiais, mais precisa-se desses espaços públicos de fomento de consciência e soluções a nível planetário para bem da humanidade inteira.

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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