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As forças que movem o mundo

Miguel Debiasi

Numa sociedade dinâmica se pergunta: o que movimenta o mundo e a humanidade? A economia? A energia? Os sonhos? Há motores que movimentam o mundo e a humanidade. Esses motores que impulsionam o planeta precisam ser explicitados e saber qual sua influência na vida humana e da civilização.    

A preocupação em saber das forças que movem o mundo e a humanidade é de todos os tempos. Estudioso da questão Santo Tomás de Aquino (1225-1274) afirma: “Em todas as causas eficientes ordenadas, em primeiro lugar está a causa do que se encontra no meio, e o que se encontra no meio é causa do que está em último lugar, tanto se os intermediários forem muitos, quanto se for um só; tiradas as causas, tira-se o efeito; logo, se não for primeiro nas causas eficientes, não será nem em último, nem no meio.  Se, porém, procedermos de forma indefinida nas causas eficientes, não haverá primeira causa eficiente e, portanto, não haverá também nem efeito último nem causas intermediárias, o que é evidentemente falso. Logo, é necessário admitir alguma causa eficiente primeira, à qual todos chamam de Deus.”

A filosofia de Aquino rejeita o antagonismo entre a razão e a fé. Existem as verdades da fé, atingíveis somente por meio da fé, por meio da revelação divina, às quais não podemos chegar através da razão. Mas nem todas as verdades podem ser alcançadas desse modo, existem também as verdades naturais teológicas. Essas verdades naturais teológicas podem ser alcançadas tanto pela razão como pela fé. A razão e a fé seriam como rios que desembocam num mesmo oceano.

Em sua obra Suma Teológica, ancorada na filosofia de Aristóteles (384 a.C. 322 a. C.), Aquino apresenta cinco vias para demonstrar a existência de Deus, o primeiro motor que move o mundo. O primeiro argumento - crê que, se tudo que move é movido por algo, não pode ser admitida uma regressão ao infinito, devendo existir um primeiro motor que é Deus. Segundo - se perguntarmos sobre o mundo e suas causas, continuaríamos perguntando “as causas de suas causas” e tudo levaria a Deus. Terceiro - se tudo na natureza fosse contingente, passageiro, é preciso que algo seja perene. Deus é o primeiro ser, origem de todas as coisas. Quarto - se todas as coisas na natureza têm uma qualidade, em maior ou menor grau, é preciso um parâmetro, a perfeição. Deus, é portador de todos os atributos e qualidades em máximo grau. Quinto argumento - se a natureza possui um propósito, deve haver uma qualidade para toda a criação, em contrário, o mundo não tenderia para o mesmo fim ou resultado. A causa inteligente do mundo é Deus.

Para os mandatários da sociedade moderna o que move o mundo não é Deus, são outros motores. Há quem pensa que o dinheiro seria o motor principal, como a substância de um sistema e valor que move o mundo e a humanidade. Há leis e princípios para o uso do dinheiro. A primeira lei é da riqueza. A riqueza não é trabalho e nem herança recebida, mas pensamento, planejamento e execução estratégica no sentido onde tudo começa e termina. A lei da negociação, todos desenvolvem aptidões para compra e venda. O valor não está apenas no produto em si mesmo, mas na habilidade de negociação. Terceira lei é do lucro. O lucro é o resultado da negociação. Ninguém tem vergonha de lucrar em seus negócios. Quarta lei é do sonho. Vivemos porque faz sentido. Poupa-se para realizar todos os sonhos. O dinheiro faz sonhar sem limites. A quinta lei é a do risco. Sem arriscar, dificilmente uma pessoa faria multiplicar seu dinheiro. O risco é um fator a ser usado em próprio benefício.

Aplicando as cinco leis, alcança-se o desejado sucesso na vida. Na vida real nem todos são hábeis para aplicar corretamente essas leis. Há complicadores para uso do dinheiro, como taxas, juros e políticas econômicas estabelecidos por terceiros. O idealizador do Plano Real, André Lara Rezende alerta e condena a taxa de juros de 13,75% estabelecido pelo Comitê de Política Monetária (COPOM) do Banco Central. A alta taxa de juros impossibilita a retomada do crescimento econômico e a capacidade das famílias e empresas saírem do endividamento bancário. Essa política monetária protege o patrimônio dos mais ricos e contribui para a perda de credibilidade de investimentos das famílias e empresas. Os bancos e as instituições financeiras são os grandes beneficiados com a atual política monetária, cobrando elevados juros aumentam seus lucros e ganhos.

Para o economista Bresser Pereira, a política monetária do Banco Central aplicada de forma independente atende os interesses neoliberais. Nos EUA e na Europa não há essa autonomia do Banco Central em relação à política econômica e fiscal do governo. Na crise econômica de 2008 a Europa e EUA quebraram por conta dessa política monetária autônoma do Banco Central. Por esse caminho, o Brasil continuará a manter os juros entre 12% a 14%, taxa bastante elevada. Essa política monetária mantém a inflação relativamente baixa, mas provoca perda da capacidade financeira das famílias e empresas, e o crescimento econômico do país não ultrapassa 1,5%.

As críticas ao Comitê de Política Monetária do Banco Central, por manter a alta taxa de juros, em 13,75%, são decorrentes da nova proposta de arcabouço fiscal e crescimento econômico para o país proposta pelo governo federal. Segundo o governo federal a medida do Banco Central gera aspectos negativos para um país, apesar de controlar a inflação, afeta os preços, diminui consumo e os investimentos das famílias e empresas brasileiras; causa queda na demanda por bens e serviços; determina declínio das atividades que geram recursos financeiros e empregos. Na opinião de muitos economistas e do governo, a medida do Banco Central é contraproducente.

O fato é que todos estamos presos nas armadilhas do dinheiro sob o controle da política monetária, dos altos juros. Cabe ao governo federal debater a melhor política financeira, fiscal e monetária para o desenvolvimento do país, das famílias e das empresas. O Banco Central ainda que seja autônomo não é independente da situação do país e do governo.

Seja qual for o desfecho desse debate, temos a nítida impressão que o mundo é movido pelo dinheiro, pelo bolso dos bancos e instituições financeiras. Nenhum cidadão foge do controle monetário e bancário, ainda que acreditamos que o mundo seja movido por uma força superior, Deus. Para contrapor o atual sistema econômico que concentra em poucas mãos bilionárias, é preciso caminhar na direção do primeiro motor do mundo, como orienta Jesus: “não podemos servir a dois senhores, no risco de amar um e odiar o outro” (Mateus, 6,24). O primeiro motor, o mais importante, Deus propõe colocar tudo em comum para suprir as necessidades de todos (Atos dos Apóstolos 2,45). Partilhar e colocar em comum tem sua força libertadora.

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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