A homilia do Frei Gregório Dezem
“A fé vem da pregação e a pregação é pela palavra de Cristo” (Romanos 10,17). A afirmação de Paulo dirigida a Igreja primitiva de Roma ressalta duas verdades eclesiais: a fé nasce do anúncio; e o anúncio é a voz da palavra de Cristo. A homilia será sempre uma das dificuldades dos presbíteros, pastores, diáconos e bispos. Na exortação apostólica Evangelii Gaudium – Alegria do Evangelho – o papa Francisco apresenta orientações para preparar a homilia.
Na história da Igreja a homilia teve muita relevância e destacaram-se bons pregadores. A origem etimológica do termo homilia tem face pedagógica. Do termo grego homilia significa “lições do professor”, discurso para ser dito em praça pública, para grande audiência. Do termo latino homilîa significa uma “conversa familiar” que acontece num ambiente de celebração eucarística. A homilia distingue-se do sermão – que figura um discurso tedioso e moralista. Na homilia ou na prédica homilética o ministro/pregador precisa considerar três elementos: a leitura do texto bíblico, sua inserção com o contexto litúrgico e a sua relação com os assuntos e realidade social do seu tempo e da comunidade. Os três elementos bem correlacionados levam a aplicação da Palavra da Escritura à vida quotidiana, ao ensinamento e as orientações para a vida, formação e animação da fé da comunidade ouvinte.
A homilia que segue uma estrutura tripartida há uma introdução que o ministro/pregador expõe o tema a tratar; na segunda parte trata do desenvolvimento do tema em que o ministro/pregador faz uma leitura hermenêutica do texto bíblico e sua exegese; e conclui a homilia ou “conversa familiar” com a ligação da Palavra da Escritura com a vida prática. Em tese a preparação de uma homilia parece fácil, mas na prática a articulação dos três passos é exigente, para muitos pregadores algo dificílimo.
Em cada período histórico da Igreja não faltaram pregadores que se destacaram em seus ministérios pelo anúncio do Evangelho e sua vivência. Na Igreja nascente recordamos o grande pregador São Paulo, apóstolo que prega aos primitivos cristãos romanos: “Como poderiam crer naquele que não ouviram? E como poderiam ouvir sem pregador? (Romanos 10,14-15). Para Paulo, o bom pregador busca configurar sua vida à vida de Cristo, deixando o próprio Espírito do Senhor a condução da sua pregação.
No período dos Santos Padres da Igreja, ou dos primeiros três séculos de nossa era, também chamado de Patrística, destacaram-se grandes pregadores. Entre tantos, São João Crisóstomo conhecido como “boca de ouro” porque fazia sermões de horas inteiras. Hoje uma das obras mais lidas do período da patrística ou dos Santos Padres é Os Sermões de Santo Agostinho. Destacar os bons pregadores do período patrísti1co fica difícil, são inúmeros.
Na Idade Média Santo Antônio de Pádua encantava a todos com sua pregação de grande sabedoria bíblica e espiritualidade envolvente em suas palavras. São Domingo Gusmão despertou sua paixão pela pregação que começou a atrair pessoas que desejam seguir seu apostolado e carisma. Assim, surgiu um grupo de jovens chamados de “Irmãos pregadores” que se tornaram a “Ordem dos Frades Pregadores” e que por causa do Santo, são chamados de Dominicanos.
Em era contemporânea o padre brasileiro redentorista Vitor Coelho de Almeida (1899-1987), é conhecido como o “Apóstolo de Aparecida”, a voz profética do Santuário Nacional de Aparecida. Em seu ministério sacerdotal demonstrou ser um grande anunciador do Evangelho de Cristo. Outro muito conhecido é o capuchinho e teólogo italiano Frei Raniero Cantalamessa, pregador para a Casa Papal desde 1980.
O papa Francisco diz que “a homilia é o ponto de comparação para avaliar a proximidade e a capacidade de encontro entre o pastor com seu povo”. A Igreja é mãe que prega ao povo como uma mãe fala ao seu filho. A conversa de mãe e filho é de confiança, ambos sentem-se bem e amados. O pontífice diz que o pregador precisa ter o tom caloroso em sua voz, mansidão de suas frases, alegria em seus gestos, ser capaz de revelar mistérios e cativar o ouvinte com ensinamentos tão elevados e exigentes.
O Frei capuchinho Gregório Dezem é um insigne pregador de nosso tempo. Suas homilias não são preparadas pesquisando na internet reflexões prontas ou em livros de comentários homiléticos. Também não é dado ao exercício da oração mental e nem segue o roteiro da Lectio Divina, métodos orantes criados pelas Ordens Mendicantes da Idade Média. Estes métodos têm muita dificuldade de renovação como do método histórico crítico. A oração mental corre o perigo de levar orante a afastar-se da realidade temporal. A Lectio Divina lhe falta às perguntas essenciais para o nosso tempo, aquelas que levam o orante perguntar-se como chegar a viver a fé cristã de forma ética e libertadora.
Frei Gregório recolhe-se em seus humildes aposentos com a Sagrada Escritura sobre a escrivaninha lê o texto bíblico proposto pelo calendário litúrgico. Passa horas e horas recolhido a meditação no silêncio oculto. No silêncio oculto vive intensamente com Aquele que lhe fala. Vive em sintonia com Aquele que comunica. Ouve a voz da perfeita sabedoria. Abre seu espírito, coração e mente para a mensagem do Altíssimo.
Das longas horas de silêncio oculto as homilias são escritas a punho em pequenos papéis que colocados sobre o altar leva o pregador com profunda sabedoria a conversar serenamente na perfeita relação entre o texto bíblico e a vida do povo. Em todos os textos bíblicos, palavras fortes são extraídas e comunicadas que leva o ouvinte com facilidade relacionar palavra de Deus com a vida e situação humana. A comunidade ouvinte sente que a fala da homilia não é a do pregador, mas do Senhor, o mestre do anúncio. Quando o Senhor fala pela voz do bom pregador o ouvinte ouve a voz do profetismo, a palavra da verdade, a conversa que transforma e liberta das situações injustas. Com três décadas de pregação, confesso minha pequenez diante deste bom pregador, frei Gregório.
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