Ela trabalha para acolher os imigrantes negros (haitianos e senegaleses, principalmente) que chegam à Serra Gaúcha à procura de uma vida melhor. Moradia e emprego, pelo menos. É o que todos querem e merecem. O projeto é importante e necessário, mas seria injusto limitar o trabalho de Juçara de Quadro a ele. Não é de hoje que ela defende os Direitos Humanos.

Juçara é uma das precursoras do movimento negro, em Caxias do Sul. Começou a participar quando percebeu que precisava agir para garantir respeito a direitos fundamentais. “A gente tem essa dificuldade com os imigrantes que estão aí e com os nossos afro-brasileiros não é diferente. Minha irmã fazia Serviço Social, mas nunca conseguiu ser reconhecida pelo trabalho. Racismo puro! (diziam que) Poderia ser uma boa secretária. Na minha juventude, eu apresentava meu currículo (e diziam): ‘teu currículo é maravilhoso, mas...’. Sempre tinha um ‘mas’ e eu sabia que o ‘mas’ estava na cor da pele. A gente enfrentou muitas dificuldades”, afirma.

Os amigos dizem que os problemas fizeram de Juçara uma mulher mais forte. Alguns garantem que a reconhecem pelo grito (risos). E ela nem faz questão de negar. Aliás, por que negaria?! (mais risos) “Tem que ser no grito. Firmeza! Uma vez me disseram: ‘de repente, se tu falar baixinho...’. Não, tu não consegues fazer com que as pessoas te atendam. Eu sofri violência doméstica e precisei aprender a reagir e me posicionar. Foi dali que surgiu essa maneira de ser”.

Foram dois anos de agressões dentro de casa. Juçara conseguiu denunciar o crime numa época em que muitos jogavam olhares negativos sobre mulheres separadas. “Havia muito preconceito. A mulher tinha que se calar ao homem. Tu passavas a viver aquela violência e tinha vergonha de ser uma mulher separada. Hoje, eu diria que agi tarde demais. Eu nem estaria viva, se continuasse (no relacionamento)”, desabafa.

Juçara encarou porque tem na luta pelos Direitos Humanos uma das razões para viver. Ela também participa do movimento de defesa dos direitos das mulheres e trabalha como assessora parlamentar. (E, de novo, seria injusto limitar o trabalho dela a essas causas, também muito importantes.) Todos os dias, ao fim do expediente, Juçara vai para casa, coloca um avental e assume a cozinha. Fazer comidas típicas da Serra Gaúcha é terapia e fonte de renda. Dizem que o agnolini (massa muito parecida com o capeletti) é dos bons!

O samba está no sangue da caxiense. A mãe foi cantora de rádio. “Comecei a frequentar o Gaúcho ainda na barriga da minha mãe”, diz ela, referindo-se a um dos clubes mais tradicionais da serra, fundado em 1934 para acolher os negros que não eram recebidos em outros clubes de Caxias do Sul. Juçara é considerada a rainha do samba da cidade. Luta para garantir investimentos e recursos para o Carnaval.

Festa e muito trabalho. “Sou mulher e sou negra. Entrei na luta para que não visse outras mulheres passarem pelo que passei. As coisas (ruins) continuam acontecendo e queremos ver se param. Por isso, continuo na luta”.

Clique no podcast ao lado e conheça outras histórias de Juçara de Quadro, entrevistada desse sábado (21) do programa Conectado Perfil.