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Páscoa, a renovação da vida

Miguel Debiasi

 

A festa religiosa mais importante dos cristãos é a Páscoa de Cristo. Dada a sua importância, as festividades da Páscoa costumam ser bem preparadas pelas igrejas cristãs. Os cristãos com suas comunidades eclesiais são chamados a fazerem da solenidade da Páscoa a oportunidade de conversão e de renovação da vida. A cada Páscoa renova-se as motivações por uma nova humanidade, a reconciliada em Cristo.

A Páscoa cristã tem uma longa história e uma rica tradição. Na tradição hebraica, a Páscoa recorda e celebra que Deus, chamado pelos hebreus de Javé, convoca Moisés e o envia com uma ordem: libertar seu povo do cativeiro da escravidão (Êxodo 33). O processo de libertação do povo hebreu foi longo e vagaroso, uma sofrida caminhada na qual Deus se fez presente e atuante por meio do comando de Moisés. A liderança de Moisés contou com a participação de outros líderes como de Aarão e Mirian. Mas a liderança maior era Deus que fez uso de dez pragas sobre o Egito manifestando seu grande poder e para que seu nome fosse glorificado e seu projeto aceito por toda terra (Êxodo 9,14-16). Na passagem do anjo da morte durante o acontecimento da décima praga do Egito, os hebreus untaram as ombreiras das portas para que suas vidas fossem preservadas da ira do Senhor (Êxodo 12,22-23). Quarenta anos depois, já na Terra Prometida o fato da libertação do Egito é celebrado pelo povo como Páscoa, para os judeus a “Pesach”, que significa “passagem”.

Essa caminhada de constituir um povo livre, Deus já tinha prometido ao patriarca da fé, Abraão, aproximadamente 500 anos antes do envio das pragas e da libertação do Egito (Gênesis 12,1). Originalmente, a Páscoa foi um acontecimento do povo de Israel, dos hebreus, e que no cristianismo passou a ser comemorada com novo significado, constituído pelo mistério pascal de Cristo. A data de comemoração da Páscoa cristã foi estabelecida pela Igreja no século IV d. C., quando foi realizado o Concílio de Niceia, ano de 325. O Concílio estabeleceu que a Páscoa seria celebrada no primeiro domingo após a lua cheia que acontece após o equinócio de primavera, no Hemisfério Norte. Pelo calendário civil, anualmente, a Páscoa cristã é celebrada durante o período que fica entre 22 de março e 25 de abril.

 

Na história bíblica e na tradição cristã a celebração da Páscoa tem um significado redentor, a vida humana livre da escravidão e liberta de todo pecado. No cristianismo, a Páscoa possui um significado distinto da crença judaica, ainda que tenha uma relação direta com a dos judeus. Para os cristãos, a Páscoa é o acontecimento da condenação, crucificação, morte e ressurreição de Jesus Cristo. A ressurreição de Cristo após o terceiro dia da crucificação, coroa a celebração pascal. O apóstolo Paulo escreve: “se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa pregação, e também é vã a vossa fé” (1Coríntios 15,14). Essa afirmação diz do grau da importância da ressurreição de Cristo. A morte de Cristo, embora entregue pelos sumos sacerdotes aos romanos para que fosse crucificado, é um sacrifício amoroso de parte de Deus para salvar a humanidade de seus pecados (João 18,1-42). No sacrifício amoroso de Deus a humanidade recebeu gratuitamente a oportunidade de uma nova vida.

A Páscoa não é apenas memória, mas vivência e atualização deste fato salvífico. Na comunidade cristã a Páscoa é preparada por um período de intensa espiritualidade e atividades como de caridade e solidariedade que manifestam a conversão humana. A preparação da Páscoa inicia com a quarta-feira de Cinzas e transcorre o período da Quaresma, quarenta dias. Os quarenta dias é tempo suficiente de preparação dos cristãos onde se intensificam os exercícios espirituais como de jejuns, oração e esmola ou caridade. A quaresma encerra com o Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor, que abre a Semana Santa. O Domingo de Ramos celebra a entrada de Jesus à cidade de Jerusalém, aclamado pelo povo como Rei Salvador (Mateus 21).

A rica liturgia da Semana Santa celebra os eventos importantes do mistério Pascal de Cristo. Na quinta-feira recorda a Última Ceia, Cristo reuniu-se com seus discípulos pela última vez e celebrou com eles. Na ceia Jesus indica a traição cometida por Judas Iscariotes e de sua negação realizada por Pedro. Durante a celebração realiza-se o rito de lava-pés, fazendo memória do ato de Jesus de lavar os pés de seus discípulos e do novo mandamento, do amor. Na sexta-feira é lembrada a prisão de Cristo enquanto estava rezando ao Pai no monte de Getsêmani e que por meio da traição de Judas Iscariotes foi julgado e condenado. No processo de condenação, Cristo foi duramente torturado, flagelado e finalmente crucificado na montanha fora da cidade de Jerusalém, chamado monte Gólgota. O sábado após a crucificação de Cristo é celebrado como Sábado de Aleluia ou da Vigília Pascal e o Domingo dia da ressurreição de Cristo, a Páscoa. Com o Domingo da Páscoa inicia-se o tempo pascal que compreende cinquenta dias da ressurreição a festa de Pentecostes, dias vividos e celebrados com grande júblio espiritual, sinal de nova vida.

Páscoa é viver e celebrar em Cristo a passagem, a mudança de vida, o maior acontecimento da história da humanidade. Os cristãos se reúnem em suas comunidades como povo de Deus para celebrar a Ressurreição de Jesus Cristo, Sua vitória sobre a morte e Sua passagem transformadora em nossa vida. A Páscoa de Cristo nos convida a entrar para a história da salvação e reviver a ação de Deus em prol dos seres humanos. No livro do Êxodo nos fala acerca de um cordeiro cujo sangue derramado e aspergido sobre as casas dos filhos de Israel, protegia-os quando Deus passasse em julgamento através da terra do Egito. Na condenação, crucificação e morte de Senhor Jesus é reconhecido com o verdadeiro cordeiro, o cordeiro de Êxodo é apenas uma pequena sombra. A Igreja, os cristãos e a humanidade crê que o cordeiro, cujo sangue precisa ser derramado como expiação pelo pecado, é do Filho unigênito de Deus, enviado e entregue por Deus para salvar o mundo (Êxodo 12,22-23).

Na história bíblica e na rica tradição cristã na Páscoa existe um ponto e um significado redentor, no mistério Pascal de Cristo, todas as coisas feitas sob a mão de Deus foram salvas. A cruz e a ressurreição de Cristo supre tudo, assim, em tudo nos assegura, a vida em sua plenitude. A segurança do ser humano consiste no relacionamento amoroso com Cristo, que morreu para dar fim ao pecado. Nenhum fato ou outra coisa poderia satisfazer nossa condição humana, a não ser o sangue derramado de Jesus. Cristo levou o julgamento à história em Seu próprio corpo na cruz. Toda preparação para Páscoa e todas as reivindicações de Deus foram satisfeitas pela morte e ressurreição de Cristo. Pela ressurreição de Cristo, tudo que era contrário a Deus foi derrotado, posto de lado para todos os tempos. Novamente celebrar a Páscoa do Senhor, é viver a obra da redenção humana e da glorificação de Deus. Em sua Páscoa Cristo realizou quando, morrendo, destruiu a morte e ressuscitando, renovou a nossa vida.

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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