O país da pobreza
A história oficial do Brasil apresenta aos alunos de ensino fundamental e médio, de forma didática, bem pouco da real situação do país. A história narrada é sofisticada. É a da casa-grande, dos sobrados da burguesia, dos indivíduos situados em níveis superiores da classe média. É a história correspondente às elites que se mantém no poder desde sua "descoberta". Bom seria se a narrativa fosse ao menos real. Na real é outra.
A história contada é identificada com as mansões e com seus terrenos amplos, com seus habitantes orgulhosos do progresso patrimonial. Nesta narrativa predomina a afirmação dos setores médios, composto por profissionais liberais, médicos, advogados, funcionários públicos, comerciantes, empresários. Estuda-se a história dos políticos aparelhados ao Estado e aos poderes da República, dos heróis das revoluções regionais, dos membros da equipe da elite política do país. Sem dúvida alguma, descreve uma história que representa a estrutura do sistema, voltada mais para os interesses de uma classe privilegiada e menos para a nação, para a população.
Por detrás desta narrativa existem as pessoas das camadas populares, pobres, são famílias modestas, agricultores, pescadores, bóias-fria, operários, empregados domésticos. Todos estão a serviço das casas-grandes, mansões, condomínios de luxo, fazendas, empresas, etc. Historicamente, isto significa que a maioria da população foi submetida a serviço e a manter a estrutura social e a política de categorias sociais distintas. Ademais, desenvolveram-se valores e mentalidade de modo a não comprometer as relações sociais estabelecidas pelo sistema. A partir disto as perspectivas individuais são canalizadas sem que haja espaço à contestação do sistema, como assegura o lema da bandeira nacional: “Ordem e Progresso”. Na verdade, pouco está em ordem e pouquíssimo é o progresso.
Ao tomar como parâmetro a região metropolitana de São Paulo, maior polo do poder econômico do país e que concentra 39 municípios, existem em torno de 700 mil pessoas vivendo na pobreza extrema. Segundo a instituição financeira LCA (Letras de Crédito do Agronegócio) esse número é 35% maior do que era em 2016. Conforme levantamento do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) houve o acréscimo de 180 mil pessoas em estado de pobreza naquela região. Para levantamento dos dados a LCA usou metodologia de análise do Banco Mundial, que considera em situação de pobreza extrema quem recebe 1,90 dólares de renda domiciliar diária por pessoa.
Conforme estudo da LCA, o Brasil atingiu o menor nível de investimento público nos últimos 50 anos, índice que não chega a 1,17% do Produto Interno Bruto (PIB). Isto significa que os recursos aplicados são insuficientes para a conservação dos equipamentos patrimoniados. Isto é, a política de investimento do governo é insuficiente até para manter os equipamentos de serviços públicos. Segundo o Tesouro Nacional os R$ 76,9 bilhões aplicados no ano passado não foram suficientes para cobrir a depreciação dos ativos públicos, gerando um negativo de R$ 36,5 bilhões. De acordo com o departamento do Plano Anual de Financiamento (PAF), a dívida pública poderá fechar este ano entre R$ 3,78 trilhões e R$ 3,98 trilhões. Conforme dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), o nível de pobreza voltou a crescer acima da média obtida até o ano 2015.
Certamente, a narrativa da história em espaços educacionais pretende satisfazer indivíduos privilegiados com a estrutura da desigualdade social. Por outro lado, o segmento social das camadas populares ou de menor e baixíssima renda que formam grandes favelas, jamais será lembrado em narrativas oficiais do Brasil. De qualquer modo, mesmo crescendo os desníveis sociais, a maioria da população é formada por cidadãos que executam o árduo trabalho de movimentar o Brasil. Embora esses indivíduos do mundo de baixo sustentem o andar de cima, são ignorados pelo governo e suas instituições.
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