O diálogo como Caminho de Unidade e Paz
Todos aspiramos a um mundo de unidade e paz. Só pessoas psicopatas, doentes ou mal-intencionadas gostam de armas, de tensões, conflitos ou guerras. O sonho de quem experimenta em si e quer estender aos outros o calor de humanidade e solidariedade, é de que um dia possamos viver em sociedades onde não haja mais divisões, tenham elas suas raízes em diferenças econômicas, políticas, culturais, étnicas, religiosas, de gênero ou de qualquer espécie. E que, da superação das divisões, nasça a paz tão anelada que nos permita aproximamo-nos de cada pessoa, por mais próxima ou mais diferente de nós, sem receio de ser rejeitado ou agredido e sem provocar nela temor algum.
A fé cristã expressa esse sonho de unidade nas palavras dirigidas por Jesus a seus discípulos no encontro de despedida que com eles fez antes da paixão em Jerusalém. Na conversa com os discípulos, Jesus anuncia que parte para o Pai, mas não os deixará sós. De junto do Pai, Ele enviará seu Espírito para continuar a animá-los na caminhada. E diz aos discípulos que deixará a paz como sinal de sua presença: “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou, mas não a dou como o mundo.”
Ao ouvir essa afirmação, logo surge uma pergunta: por que Jesus acrescenta, depois de ter anunciado a paz, que a sua paz não é a mesma que o mundo dá? Haverá duas formas de paz? A paz de Jesus e a paz do mundo?
Ciente da realidade do mundo que o envolve, Jesus sabe, sim, que há dois tipos de paz. A “paz do mundo” é a “pax romana” vivida em seu tempo. A paz imposta pela força das armas. A paz que não permite a diferença. A paz que exige uniformização e submissão. É a paz dos impérios que se constroem pela destruição do diferente. A paz que se nutre da eliminação de pessoas, comunidades, nações e culturas. É a paz dos cemitérios, dos presídios, das casas de tortura, das valas comuns, dos campos de concentração e extermínio. É a paz que nasce da morte, se nutre da morte e que gera morte.
Essa paz Jesus não quer. Essa paz o cristão não pode aceitar. A verdadeira paz é aquela que nasce da justiça, da acolhida do outro, da aceitação do diferente e do voltar-se para aqueles e aquelas que precisam da mão estendida para levantar-se do chão onde foram jogadas pela força da opressão.
A verdadeira paz é exigente. É mais do que um pacifismo que ignora as dores e os sofrimentos dos fracos, dos humilhados e da criação. E ela e difícil inclusive para os cristãos. Nas primeiras comunidades cristãs, assim que surgiram as primeiras tensões por causa das diversidades nelas existentes, a tentação foi a de impor a uniformidade. Os cristãos provindos do judaísmo passaram a exigir que os cristãos oriundos de outras culturas adotassem as tradições e costumes judaicos. Que não comessem carne de animais considerados impuros e se circuncidassem assim como os judeus os faziam.
Por sorte, Paulo e Barnabé, com a força do Espírito Santo, fizeram ressoar de novo no coração da comunidade o ensinamento de Jesus que não exigia a uniformidade mas respeitava cada um no seu modo de ser. Depois da assembleia conciliar em que cada um pode expor seu modo de pensar, a comunidade decidiu não impor nenhum fardo além do indispensável. No relato dos Atos dos Apóstolos, o indispensável é não deixar-se contaminar pela ideologia dominante transmitida por uma religião que, ao invés de pregar a misericórdia, exigia sacrifícios e legitima a dominação. Na Carta aos Gálatas, Paulo, de sua própria palavra, diz que a única condição necessária para que se construa uma comunidade unida e em paz, é “que os pobres nunca sejam esquecidos” (Gal 2,10).
Na soma dos dois textos, o caminho para a construção da unidade e da paz: o diálogo transparente que supera as ideologias de dominação e a justiça para com os mais pobres. Na medida em que estas duas práticas começam a ganhar espaço na Igreja e na sociedade, abrem-se as portas para a Nova Jerusalém.
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