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Tudo que se compra tem pouco valor

Miguel Debiasi

A moeda, o dinheiro, os ganhos, a propriedade privada são obras do ser humano, oriundas de sua ganância e ambição. Com isso, o dinheiro se transformou no bem mais precioso, para muitos humanos seu próprio deus. O apego ao dinheiro corrompe os seres humanos, seus sistemas e instituições. Mas, na verdade, tudo que se pode comprar tem pouco valor.

O mundo está submetido ao mando do dinheiro. As primeiras e as últimas informações do dia são referentes às moedas, à Bolsa de Valores, ao mercado. A economia é o alimento do dia. Sem o dinheiro não há pão. Sem ele não há vida, nem esperança. Por conseguinte, os centros comerciais tornaram-se uma espécie de catedrais muito frequentadas. O consumo é sinônimo de satisfação e de prazer humano. Na desmedida fúria dos lucros o capitalismo dividiu o mundo entre ricos e pobres, saciados e famintos, privilegiados e sacrificados, felizes e infelizes.

Porém, na ganância por dinheiro outras e mais sofisticadas práticas de corrupção surgiram e fomentaram guerras entre países, povos, pessoas, pais e filhos. A ganância por dinheiro e poder é tão poderosa que leva o ser humano a dominar o mundo. Neste sistema, Jesus de Nazaré também foi tentado pelo fascínio do ter, do poder e do ser. O diabo levou Jesus para o monte alto e mostrou-lhe todos os reinos do mundo com seu esplendor e disse: “tudo isto te darei se, prostrado, me adorares” (Mateus 4,9). As três tentações de Jesus relatadas pelos textos bíblicos: de buscar alimento sem o auxílio de Deus, de tentar a Deus para satisfazer-se, e, de renegá-lo para seguir os falsos deuses, exortam o quanto esses poderes são maléficos ao ser humano.

Entretanto, o sistema capitalista cultiva nas pessoas que não existe vida sem dinheiro, propriedade privada, bens. Na realidade quem não possuir dinheiro e bens materiais deixa de ser humano. É notório que os empobrecidos são insignificantes ao sistema por razões óbvias, não são consumidores. A economia globalizada considera cidadãos os consumidores. Em razão disto, o mundo rejeita os pobres, imigrantes, estrangeiros. Ademais, há quem defenda que eles precisam ser eliminados, tidos como um peso e estorvo para o desenvolvimento da economia.

Por tudo isso, não parece exagero dizer que, em princípio, ao menos, tudo que se compra tem pouco valor. O discurso do ódio, intolerância, discriminação contra as classes pobres é fruto da ganância dos seres humanos. Pior, na maioria das vezes tal discurso tem o suporte da religião que prega que o capital, o dinheiro e as posses são uma bênção para o ser humano. É preciso tomar consciência de que, de acordo com os pressupostos da vida humana e cristã, aquilo que se pode comprar tem pouco valor. A vida não se compra. A honra também não. O respeito do outro muito menos. A felicidade não tem valor. Jesus Cristo nunca teve um tostão ou uma posse.

Como diz o filósofo alemão Heidegger “o homem é aquele ente que se interroga sobre o sentido do ser”. Em outras palavras, o homem não se reduz a posses. A pessoa é um ser-no-mundo mediante a existência do outro. O ser humano tem sentido quando estabelece relações sociais sem a negação dos outros. Portanto, o que se adquire ou compra é insignificante diante da vida do outro, sobretudo do pobre. 

 

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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