Política da Libertação
Toda ação deveria ser uma libertação. Todo pensamento deveria aluminar as nossas decisões e ações. Todo sentimento deveria engrandecer a vida na sua totalidade. O ensino deveria nos libertar de toda alienação. Os poderes constituídos deveriam legislar, administrar e julgar pela justiça social. Todo movimento humano deveria ser um passo a mais no caminho da libertação. Nem tudo é assim. Há uma realidade de analfabetismo, ignorância política, consciência indolor a todos problemas sociais, ecológicos e humanos. Nesse horizonte há muitos desafios a serem enfrentados.
A história mundial é narrada a partir da ótica do colonializador, do invasor, do violento, do poder absoluto e arbitrário. Essa condição deu razão para o homem atentar contra a vida de outro. A escravidão denuncia essa postura. O extermínio dos índios não pode negar a existência de tantos agressores. É injustificável o extermínio de judeus em câmara de gás, em campos de concentração sub-humanos. O empobrecimento dos povos nativos não inverte os fatos horrendos. A discriminação do gênero feminino obedece a ordem da superioridade masculina. As Guerras Mundiais não pesaram na consciência dos bárbaros. A fome, pobreza e abandono social obedecem às regras do senhorio político que lhe aprouve negar a vida do outro. Desta maneira, continua-se a narrar a história sem indolência à custa do sofrimento da maioria da população mundial.
Os fatos desumanos levam aos cristãos a perguntarem: por qual barbaridade esperamos para nos inquietarmos? A fé e a prática da religião cristã poderia nos inquietar e a obedecer a este reinado humano tão injusto e que se escusa por tantos males praticados? Em que sentido o Evangelho poderia justificar tantos males que levaram a tantas mortes e provoca novos cativeiros humanos? O filósofo Aristóteles com toda sua sabedoria justificava a escravidão. A Igreja acompanhou o colonizador e o abençoou. No Brasil não falta historiadores exaltando os heroicos “descobridores” portugueses e espanhóis que exterminaram milhões de indígenas. Nesta narrativa poderes e mídias foram se constituindo em grandes grupos coorporativos justificando diariamente a visão dos dominadores. Políticos cristãos justificam da continuidade do colonialismo para ganhar o céu com a morte de tantos inocentes. Dorme-se com a consciência tranquila num Estado que paga altos salários, mordomias, regalias, gordas aposentadorias a poucos privilegiados e reluta socorrer aos pobres com míseros duzentos reais por alguns meses.
As longas páginas que exaltam a história do colonizador, invasor, violento e arbitrário, vozes se levantam para denunciar que ali havia pessoas que choravam a morte de seus filhos e de suas esperanças. Bartolomeu de Lãs Casas (1484-1566) levanta sua voz a criticar a escravidão dos índios, negros e nativos latinos. O filósofo argentino Enrique Dussel (1934) lembra que Lãs Casas considerava o colonizador português e espanhol a causa de tantas injustiças praticadas contra os índios, negros, nativos latinos. Dussel recorda do frei dominicano Tomás Mercado (1523-1575) que sua Suma de tratos e contratos, ataca profunda o tráfico de escravos praticado pela instituição portuguesa e espanhola. O teólogo jesuíta Luís de Molina (1535-1600) descreve do sofrimento dos escravos e que nada era comparável tamanho brutalidade. O padre jesuíta Alonso de Sandoval (1576-1652) denuncia que a tortura dos escravos nunca feriu a consciência da instituição escravista. Francisco José de Jaca (1645-1690) redige uma resolução sobre a liberdade dos negros com ataques a instituição da escravidão. No Brasil, o padre e filósofo Antônio Vieira (1608-1697) reluta em deparar-se com a realidade, mas ressalta dos excessos da escravidão.
Dussel propõe uma Política da Libertação para libertar o Estado que vive na enfermidade e nutrir a população da América, homens e mulheres, para uma mudança de atitude radical em favor da vida. É preciso o enfrentamento para uma correção de juízo e de estruturas que ilegitimamente e injustamente determinaram poderes e condições que não paga salários justos, que derrame sangue de pobres e idolatra a ação do opressor e explorador. Entre muitos insultos e gravíssimos males, danos e escândalos é aceitar que cristãos justiquem tantas injustiças que rouba a vida de milhões de pessoas em favor do senhorio. Toda instituição e poder estão sendo exercidos em favor do agressor e por aqueles que impuseram até as últimas consequências sofrimentos aos ameríndios, africanos e latino-americanos. A reversão desta situação deve-se ao papel do cristão se não negar a mensagem do Evangelho. É preciso dar-lhe ao cristão o ensino do Evangelho e a educação política libertadora. O Reino de Deus que Jesus anunciou não é um conceito, mas a defesa daqueles que ninguém defende, os pobres e as multidões famintas de pão e de justiça social (Mateus 14,13-21). A política ou é libertadora ou não é política em sua natureza e em sua função pública.
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