Pequena história
O grande discurso deve prever palavras grandes: inconstitucionalissimamente.
O grande discurso deve conter palavras comoventes: vai (sic) morrer alguns inocentes, mas tudo bem.
O grande discurso deve transformar grandes erros em grandes excepcionalidades.
O grande discurso deve prever uma pausa para o público ficar atônito e depois reelaborar o que ouviu. Um eco repetirá no enorme salão: mas tudo bem, mas tudo bem, mas tudo bem. Em seguida, uma flatulência retumbante marcará o fim do prelúdio.
O grande discurso retomará com vigor o controle da plateia ao lembrar os grandes temas que unem a nação: o amor, as praias, o futebol. E lançará um convite ao mundo, para que venham comprovar o que diz o grande líder. Os estrangeiros não deverão mais pagar pelo visto, anuncia o grande orador. E poderão vir pela beleza das nossas... árvores. Digo, das nossas aves.
O grande discurso deve converter grandes lapsos em grandes oportunidades.
Em seguida, o grande líder mudará o ritmo do grande discurso, em tom de descomunal ameaça: as nossas florestas são a virgem que todo povo quer, mas não vai levar!
O grande discurso deve pressupor um momento de grande poder e, após a declaração contundente, o grande líder dará um murro no púlpito, para mostrar quem é que manda.
Nesta altura, as pessoas incontroladas irão ovacionar o grande discurso do grande líder. Será uma apoteose.
Um cronista dissidente irá escrever que houve um espetáculo deprimente. Será acusado de envolvimento em um esquema de corrupção, julgado, condenado, preso e relegado ao esquecimento.
O grande líder seguirá circulando pelo mundo, difundindo as suas boas-novas, sendo aplaudido e triunfando inconteste por todos os lugares. E assim, por mão do seu salvador, o grande país do grande líder que realiza grandes discursos será reconhecido finalmente como o farol do novo mundo, da nova era, do novo homem, de todas as grandes, enormes, gigantescas, incomensuráveis grandezas da humanidade nova.
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