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A forma de ser Igreja, a sinodal

Miguel Debiasi

De 02 a 27 de outubro aconteceu em Roma, a segunda sessão da Assembleia dos bispos que teve como lema: Por uma Igreja sinodal. A primeira sessão ocorreu em outubro de 2023, estudando o documento que foi elaborado através da escuta do Povo de Deus. A segunda sessão, a parte conclusiva do Sínodo, espera-se dela respostas que venham ajudar a Igreja em sua missão. Mesmo cientes que boa parte das respostas  vêm das bases, da práxis da Igreja local, do seu jeito de ser e agir no mundo.  

Há uma frase que diz: “Diga-me quem são seus amigos e eu direi quem você é”. Alguns pensam que seja uma frase bíblica, embora não se encontre essa afirmação nos textos bíblicos. Outros atribuem aos Assírios como sendo os autores da frase, proferida por volta de dois a três mil anos atrás. Acredita-se que nesta época começou-se a refletir sobre o valor da amizade entre as pessoas. Independentemente de quem seja o autor e o período histórico que foi dita, a afirmação é muito significativa em aspectos antropológico, filosófico, psicológico e sociológico.

É de suma importância reconhecer o valor da amizade em nossas vidas, porque por meio delas nos autoconhecemos e representa quem somos. A amizade nos faz perceber a qualidade de nosso ser, das nossas relações e das atuações humanas. Para entendermos as decisões da Assembleia dos bispos que estão sendo propostas é preciso olhar para o principal agente da Igreja, o Papa Francisco. Pela vida e obra de Francisco, em boa medida, entendemos as decisões de como deve ser e agir a Igreja.

A grande maioria dos cristãos conhecem o Papa Francisco a partir de sua escolha para ser sucessor de Pedro. Mas há um pré-Francisco, do sacerdote, provincial, bispo e cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio. A respeito desse sacerdote, provincial, bispo e cardeal pouco sabemos, a não ser algumas informações divulgadas pela imprensa pelo fato de sua eleição ao papado. Obviamente, haverá também um pós-Francisco, talvez, muitos aprendam a admirá-lo pelo seu pontificado e sua profecia.

O pouco que sabemos do sacerdote, provincial, bispo e cardeal Jorge Mario Bergoglio ajuda a entendermos o pontificado do Papa Francisco. O fato de ter sido eleito Papa não apagou a vida e a obra do sacerdote, provincial, bispo e cardeal Bergoglio. A vida e a obra, ou se quisermos, sua personalidade de Bergoglio, seus valores teológicos, sua prática eclesiológica e seu método de condução da Igreja integram e caracterizam o pontificado de Francisco.

Como primeiro ponto de compreensão não devemos esquecer que Bergoglio é sacerdote jesuíta, pertencente a instituição e a congregação religiosa que prima por um processo formativo qualificado pelo desenvolvimento da capacidade espiritual e intelectual. O sacerdote Bergoglio é formado na perspectiva da teologia latino-americana, que à luz do Evangelho olha com atenção para a realidade do povo sob diferentes perspectivas culturais, sociais e eclesiais ou do “múltiplo”.

Segundo, como estudioso do Romano Guardini (1885-1968), sacerdote, escritor e teólogo católico romano, o Bergoglio desenvolveu um método de reflexão teológica dos contrastes, onde uma parte sempre de alguma forma se soma a outra parte. Bergoglio não segue o método da dialética pura onde uma parte anula a outra. Pela recepção dos contrastes supera o discurso teológico de oposição e promove a cultura do encontro.

Com sua compreensão plural, o sacerdote Bergoglio elabora uma verdadeira análise da Igreja, que posteriormente como Papa indica de suas maiores crises, como: da concorrência religiosa e do encolhimento da Igreja frente o crescimento do islã ou islamismo; da secularização que impacta no campo religioso criando posições isoladas na Igreja; das questões morais, abusos como pedofilia que afrontam a moral da Igreja.  

Quarto, Bergoglio após ter sido Provincial (1973-1979) da Companhia de Jesus na Argentina, período da ditatura militar, eleito bispo auxiliar de Buenos Aires, viveu em contato com o Povo de Deus. Eleito cardeal em 2001 pelo Papa João Paulo II, Bergoglio participa de três momentos eclesiais fundamentais: 1º) Sínodo de 2001 – ao assumir a função de relatoria do Sínodo tornou-se conhecido entre os membros da hierarquia ou bispos e cardeais da Igreja; 2º) No Conclave da Igreja Católica de 2005 que elegeu o Papa Bento XVI, Bergoglio colhe os frutos de sua participação do Sínodo de 2001, sendo o segundo mais votado com 40 votos e ao retornar a Argentina é eleito Presidente da Conferência Episcopal Argentina; 3º) 2007 durante a Conferência do Celam em Aparecida, São Paulo é eleito para relatoria.

Com a renúncia do Papa Bento XVI, a eleição do Papa Francisco, em 13 de março de 2013, representou um ponto de virada na Igreja Católica, da retomada da sinodalidade. Numa entrevista concedida em agosto de 2013, o Papa Francisco dizia: “devemos caminhar juntos: as pessoas, os bispos e o Papa”. Após alguns meses de pontificado de Francisco a Igreja percebe que ela vive um novo tempo, tempo sinodal ou da sinodalidade.

O tempo da sinodalidade está presente em tudo no pontificado de Francisco. Todos os documentos como cartas encíclicas ou exortações apostólicas referem-se à Igreja sinodal. A exortação apostólica do Evangelii Gaudium – a alegria do Evangelho (2013), dirigida a toda Igreja povo de Deus, ela é o cerne da sinodalidade. A carta encíclica Laudato Si’ – louvado seja (2015), sobre o cuidado com a casa comum, indica que a sinodalidade transcende a Igreja, é própria da ação de Deus que convida toda humanidade a viver uma vida integral em sua obra criada. A carta encíclica Fratelli Tutti – sobre a fraternidade e a amizade social (2020), diz da vida sinodal – do viver juntos – que deve ser sinal em todas as pessoas.

As decisões do Sínodo dos bispos vão trazer as marcas de Francisco, que em toda sua vida de sacerdote, provincial, bispo, cardeal e de papa valorizou a práxis sinodal. Agora como Papa intensificou a práxis sinodal introduzindo na estrutura e na administração da Igreja, na cultura e prática religiosa, nas relações eclesiais e no diálogo com os diferentes e com o mundo a sinodalidade. O desafio é seguirmos seus passos, que resgata a vida cristã e ação da Igreja primitiva, que o Vaticano II a década busca valorizá-la como experiência positiva para nosso tempo, a sinodal.

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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