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Fraternidade e amizade social

Miguel Debiasi

“Todos somos corresponsáveis na construção de uma sociedade que saiba incluir, integrar e levantar quem caiu ou quem sofre”, Papa Francisco. “As pessoas são pesadas demais para serem levadas nos ombros. Levo-as no coração”, dom Hélder Câmara. A Campanha da Fraternidade deste ano tem a alma teológica e o coração caritativo do Papa Francisco e de dom Hélder, profetas de Cristo e da humanidade de nosso tempo.

Desde a sua primeira edição, em 1962, até nossos dias, a Campanha da Fraternidade é uma ação de evangelização e de conscientização das pessoas, e é realizada anualmente no tempo da Quaresma. A iniciativa começou com três padres responsáveis pela Cáritas Brasileira em 1961 que pensaram numa campanha para arrecadar fundos para socorrer os pobres. O projeto foi chamado de Campanha da Fraternidade e realizado pela primeira vez na quaresma de 1962, em Natal, no Rio Grande do Norte.

Em 1963 dezesseis dioceses do Nordeste realizaram a campanha. A iniciativa não atendeu a todos os pobres. Mas, foi o embrião para dar início a Campanha da Fraternidade em todas as dioceses do Brasil, iniciada em 1964 sob impulso renovador do Espírito do Vaticano II.

Em 1965, tanto a Cáritas quanto a Campanha da Fraternidade, devido à importância deixaram de ser iniciativa do Secretariado Nacional de Ação Social e foram vinculadas ao Secretariado Geral da CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. A partir dessa data a CNBB dinamizou a Campanha da Fraternidade, que a cada ano realiza ampla consulta para a escolha do tema, lema, composição do hino, do cartaz, mobilizando as bases da Igreja do Brasil.

Em 1970, a Campanha da Fraternidade ganhou um apoio muito significativo: a mensagem do Papa em rádio e televisão em sua abertura, na quarta-feira de cinzas. A cada cinco anos a Campanha da Fraternidade é realizada de forma ecumênica, onde outras igrejas cristãs participam de todo o processo.

Neste ano de 2024, para celebrar os 60 anos de realização da Campanha da Fraternidade, olhando para realidade social do Brasil e do Mundo nasceu a ideia do tema: Fraternidade e Amizade Social, iluminada pelo lema: “Vós sois todos irmãos e irmãs” (Mateus 23,8). Para responder a esta realidade social sobressai duas personalidades que são sinônimos de fraternidade e de amizade social, dom Hélder Câmara (1909-1999) e o Papa Francisco (1936).

Somada ao espírito quaresmal, a Campanha da Fraternidade é sempre uma oportunidade de evangelização e de conscientização das pessoas, abordando uma realidade social problemática e que exige solução com o envolvimento de toda sociedade. Escolhida a problemática social à luz do projeto de Deus e a iluminação bíblica base, prepara-se os subsídios da Campanha da Fraternidade sendo colocado à disposição das pessoas, comunidades via livrarias e sites. O material visa despertar as pessoas a viverem a fraternidade em compromissos concretos de transformação da sociedade, da Igreja e da humanidade.  

No ícone do cartaz da Campanha da Fraternidade há uma verdadeira teologia e espiritualidade libertadora. Na explicação da CNBB, no cartaz a comunidade/sociedade/igreja/humanidade é representada por uma casa, local onde são acolhidos os irmãos e irmãs para a partilha do alimento e da vida. Ao redor de uma mesa se encontram pessoas de diferentes etnias e idades, vislumbrando a amizade de Deus com todas as pessoas.

A CNBB destaca que a celebração da fé ao redor da mesa, com pão, vinho e fraternidade, é o principal símbolo da comunidade que vive a amizade como dom de Deus. Também os alimentos na mesa recordam as refeições de Nosso Senhor Jesus Cristo, com seus discípulos/discípulas e com a comunidade. As janelas indicam uma casa, comunidade, sociedade e humanidade aberta aos desafios do mundo e da realidade, como a construção de uma sólida amizade social tornando todos irmãos e irmãs.

Entre as pessoas está o Papa Francisco no centro da cena, apoiado em sua bengala, expressando que, apesar de suas limitações, ele propõe ao mundo a construção de novas relações humanas, a amizade social, por meio de sua Encíclica Fratelli Tutti. Este parece ser um caminho necessário para garantir a convivência pacífica e a subsistência digna de todos os seres humanos.

O Papa Francisco porta a cruz de Dom Hélder Câmara, expressando as semelhanças entre esses dois grandes profetas da fé que tanto colaboraram e colaboram com a história da Igreja no Brasil e no mundo. Ainda na arte do cartaz há um convite para que as pessoas de boa vontade participem da Campanha da Fraternidade de forma concreta em 24 de março, com a Coleta de Domingo de Ramos.

A Campanha da Fraternidade tem como objetivo geral: despertar para o valor e a beleza da fraternidade humana, promovendo e fortalecendo os vínculos da amizade social, para que, em Jesus Cristo, a paz seja realidade entre todas as pessoas e povos.

Os objetivos permanentes da Campanha da Fraternidade são: Despertar o espírito comunitário e cristão no povo de Deus, comprometendo em particular os cristãos na busca do bem comum; Educar para a vida em fraternidade, a partir da justiça e do amor, exigência central do Evangelho; Renovar a consciência da responsabilidade de todos pela ação da Igreja na evangelização, na promoção humana, em vista de uma sociedade justa e solidária, portadora da amizade social e fazendo todos irmãos e irmãs.

As motivações espirituais e materiais da quaresma e da Campanha da Fraternidade são desafiadoras, se assumidas são libertadoras. Diante de um mundo dividido pelas desigualdades sociais e econômicas, acreditamos que é possível pela força do Evangelho transformar essa realidade que vitimiza milhões de pessoas pela pobreza, ódio racial, intolerância étnica e religiosa, guerras militares e ideológicas.

Para vivermos bem o sentido da quaresma e da Campanha da Fraternidade, acolhamos as primeiras motivações desde dois grandes profetas da Igreja e da humanidade de nosso tempo:

“Ante as várias e atuais formas de eliminar ou ignorar os outros, possamos reagir com um novo sonho de fraternidade e amizade social que não pare nas palavras”, Papa Francisco encíclica Fratelli Tutti.

“Uma maneira de ajudar os outros, em especial os pobres, é provar-lhes que eles são capazes de pensar”, Dom Hélder Câmara.

 

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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