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Sentidos II - Olfato: cheirar teológico

Miguel Debiasi

Com o texto publicado anteriormente iniciei uma série sobre a relação entre nossos cinco sentidos e a reflexão teológica. O primeiro sentido abordado foi a visão e sua ligação com as razões de se crer em Deus. Em continuidade ao assunto, prossigo enfocando o sentido do olfato, pois o cheirar teológico aprimora a experiência e a relação entre as pessoas e Deus.

O olfato é da natureza humana e dos vertebrados. É o sentido que tem a função de captar odores. A percepção dos odores influi no crescimento e na organização do cérebro, como para inserir-se e adaptar-se em determinados ambientes. É a capacidade de experimentar as emoções e as habilidades para processar os odores. A resposta imediata aos odores transmite uma mensagem simples e binária: ou se gosta ou não se gosta. Ou de se aproximar ou de evitar. Caso uma pessoa sofra um trauma e perda o olfato, há sequelas altamente prejudiciais. Neste caso, as experiências emocionais são altamente diminuídas na sua intensidade, causando impacto na vida e nas relações, até mesmo na experiência de fazer amor, passear num jardim, caminhar num bosque, andar pelas ruas, etc.

Outra função do olfato é contribuir com os registros da memória. As memórias mais intensas e mais emocionantes incluem lembranças de odores. Ter sentido um odor uma única vez na vida pode ficar na memória até voltar a sentir esse odor. A experiência de odor pode ficar associada ao resto da vida. Por isso, a aversão que ocorre a um odor por causar um mal ao ser humano. Há pessoas que não gostam de um tipo de comida por estar associada a um odor. Aliás, a vida está associada ao odor. Com a fé não é diferente.

A princípio, a experiência de fé em Cristo supõe o envolvimento da corporeidade. Na verdade, uma das conquistas da reforma da Igreja imprimida pelo Concílio Vaticano II foi a valorização da corporeidade. Na visão teológica, a corporeidade está muito presente na vida de fé. Isto acontece de muitas maneiras, como no oferecer flores a Virgem Maria, aos santos, no acendimento das velas e de incenso, no beijo às imagens, na aspersão com água, no ungir as mãos com óleo, etc.

Na reflexão teológica o sentido do olfato é necessário para a fé. Ninguém vive a fé sem gosto, sem sabor, sem ser atraente. Do contrário seria rançosa, amarga, sem afeto. A fé se compara a um frasco de perfume. Ela perfuma a pessoa para a vida. O Papa Francisco, ao falar da simbologia dos ungidos, ressaltou que o importante não são os adornos e os paramentos para os sacerdotes, e sim o gosto de “sentir o cheiro das ovelhas”. O olfato da fé não se limita ao perfumar as mãos, a cabeça, mas inclui ser fiel à prática do Evangelho. Portanto, o olfato teológico sente as fortes emoções e intensifica os mais sublimes desejos de seguimento a Cristo. Leia na próxima crônica sobre o paladar teológico.

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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