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Praticar a esperança cristã

Miguel Debiasi

A esperança de Deus está em Cristo, construir a humanidade do amor, da justiça e da fraternidade universal. As pessoas bem intencionadas e de bom coração são movidas pela virtude da esperança. A esperança é decisiva para qualquer vida humana. As iniciativas educacionais, religiosas, políticas e sociais libertadoras são fruto da esperança. Acreditar numa nova humanidade é revestir-se da esperança cristã.

O conceito de esperança é largo. Do termo latim spes, que tem significado de “confiança em algo positivo”, deu origem ao verbo sperare, do qual gerou o termo “esperar” que significa ter esperança. Na compreensão teológica, a esperança é uma virtude por excelência que motiva a pessoa a alcançar o supremo bem, que é viver segundo a vontade de Deus. Para a psicologia, a esperança é um ardente desejo das pessoas alcançarem a maior perfeição humana. No senso comum, a esperança está relacionada às difíceis condições de vida que precisam ser enfrentadas com árdua luta. 

O filósofo grego Platão a partir da cultura grega designa: “a grande e bela esperança num além depois da morte”. No pensamento romano, o termo “spes” designava somente o momento feliz, aquela experiência prazerosa da vida. Nas culturas grega e romana, com todas suas mais elevadas expressões filosóficas, a esperança jamais atingirá um futuro melhor, feliz, dadas as condições reais e mortais das pessoas. Mas foi posteriormente pela cultura judaico-cristã que a palavra esperança elevou-se à categoria de uma virtude fundamental da vida cristã.

A esperança faz parte da fé cristã. Na história do cristianismo o termo esperança recebeu muitas contribuições como de São Paulo apóstolo, Santo Agostinho, Pedro Abelardo, Tomás de Aquino, Duns Escoto e outros teólogos. Santo Tomás de Aquino, na Summa Teológica, escreveu muitas páginas explicando os fundamentos da Esperança e de sua correlação com a Fé e a Caridade, consideradas as maiores virtudes da vida cristã. A esperança é uma virtude. A virtude de cada pessoa é o que torna bom e o que a possui torna boa a sua ação. O ato bom do homem corresponde a uma virtude humana, argumenta Tomás de Aquino.

Na filosofia moderna, a compreensão de esperança está associada ao campo da subjetividade, às paixões e às emoções. Nessa compreensão racional, a esperança acabou sendo reduzida em sua dimensão escatológica. A filosofia moderna racionalista, materialista e existencialista, impactou na expectativa da fé cristã com relação à vida temporal e após a morte. A supremacia da razão levou ao racionalismo decretar a morte de Deus. Nessa posição filosófica, a esperança não existe como virtude e não há o que esperar no presente e no futuro. O filósofo existencialista francês Jean-Paul Sartre (1905-1980) escreve sobre o drama da existência humana como da náusea e do desespero, sentimento e antíteses da esperança.

O teólogo Santo Tomás de Aquino classifica o desespero e a presunção como pecados, que são opostos da virtude da esperança. O desespero é a pouca confiança em Deus, o amor próprio, o orgulho pessoal. A presunção é achar-se alguém digno de uma posição humana e religiosa vantajosa, sem ser de fato. Desespero e presunção opõe-se à virtude da esperança e estão ligados à vaidade humana. A esperança é uma atitude cheia de vitalidade e de amor pelos valores supremos da vida humana.

Quando um cristão busca falar de esperança logo recorre aos textos de São Paulo apóstolo. São inúmeras contribuições de Paulo sobre a esperança, seja no sentido de compreensão e de vivência dessa virtude cristã: “Porque tudo que dantes foi escrito, para nosso ensino foi escrito, para que pela paciência e consolação das Escrituras tenhamos esperança" (Romanos 15,4); "Ora, o Deus da esperança vos encha de todo o gozo e paz em crença, para que abundeis em esperança pela virtude do Espírito Santo" (Romanos 15,13); "Tendo por capacete a esperança na salvação" (1Tessalonicenses 5,8).

No contexto nacional grande parcela da população está desempregada, outra trabalha na economia informal, de biscates e sem seguridade social. Ocorre também que 33 milhões de pessoas vivem em extrema pobreza, submetidos à maior desigualdade social e econômica do mundo. A superação dessa realidade exige vontade política e solidariedade coletiva. Erradicar essa situação de sofrimento humano é ter esperança num futuro melhor para todos os brasileiros.

O pedagogo e filósofo Paulo Freire escreve que a esperança parte de uma clara opção ética e humanística prévia: “o amor ao ser humano oprimido contra a sua opressão e em favor da vida e da liberdade”. Amor ao pobre à luz do Evangelho é obrigação religiosa imprescindível para os cristãos. A opção humanitária contra opressão e em favor da vida e da liberdade é obrigação ética de todos os cidadãos, independente de credo religioso, partido político e etnias. Para cristãos e não cristãos o amor e a opção ética humanística agem por uma pedagogia da esperança.

Aos novos governos e governantes eleitos cabe apresentar novos projetos sociopolíticos e socioeconômicos que transformem o Brasil numa nação mais digna a todos. Aos cristãos que tanto se envolveram na disputa política partidária, movidos mais por fanatismo do que por discernimento evangélico e ciência, agora são desafiados a testemunhar a esperança do Evangelho, aquela virtude máxima que torna boa toda ação humana. Como ensina Santo Tomás de Aquino: ser capaz de tornar boa toda ação humana é tornar-se ser humano virtuoso para bem de todos. Como diz São Paulo: “se alguém está em Cristo, é nova criação. As coisas antigas já passaram; eis que surgiram coisas novas” (2Coríntios 5,17).

Para transformar a realidade nacional adversa a tantos valores ético-evangélicos-humanísticos, o mundo e o Brasil esperam um pouco mais da parte dos cristãos, à luz do Evangelho e de Cristo, é muito possível. Como diz o provérbio popular: “a esperança é a última que morre”. Enquanto a esperança for vivenciada como virtude sempre viverá e tornará bom tudo que é realizado pela vitalidade do amor e dos supremos valores. A vida de todos, sobretudo dos últimos, dos menores, precisa ser elevada ao sumo bem, amada e valorizada como dom recebido e correspondido pela virtude da esperança. Essa é a esperança de milhões de cidadãos e cristãos.   

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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