Você está ouvindo
Tua Rádio
Ao Vivo
19:00:00
A Voz Do Brasil
20:00:00
 
 

O custeio dos sonhos

Miguel Debiasi

Todo ser humano faz a experiência do namoro e se enamora por outra pessoa. O namoro constitui a identidade da pessoa e contribui com sua personalidade afetiva e social. Namorar é crescer, amadurecer e definir personalidades e projetos pessoais. Deus também parece ter se enamorado pela sua criação e pelo ser humano, preferencialmente pelos últimos, os rejeitados e os pobres. Qual brasileiro(a) não gostaria de ter um namorado(a), sendo custeada com dinheiro público? Milhões, certamente, irão rejeitar essa oferta, por se tratar de um custeio nada ético, inadmissível.

A filosofia estoica desenvolveu uma ideia de ética enquanto mediação para um “fim” fundamental. Alguns filósofos estoicos como Zenão, Crisipo, Possidônico e Hecatão chegaram a escrever um tratado com o título “Sobre os fins”. Para estes o fim estaria relacionado a natureza. Para o homem, conforme sua natureza, o fim supremo seria a virtude e a felicidade a ele conexa. A virtude, para os estoicos, consistia em viver em harmonia com a própria natureza humana, portanto, a racional. Logo, a felicidade está relacionada o crescimento racional, fazendo uso da razão desenvolve-se as virtudes éticas. Virtude e felicidade conexas enriquece a natureza humana subjetiva e objetiva, portanto, todas as relações sociais.

O estoico Lúcio Aneu Séneca ou Sêneca (4 a.C. 65 d.C.), que foi um filósofo e um dos mais celebres advogados, escritores e intelectuais do Império Romano, esclarece sobre os preceitos éticos e morais. Para Sêneca para viver dignamente, portanto, de forma ética, não basta dispor de preceitos morais, é preciso ter algo a mais, um objetivo que guie e anime aqueles preceitos. Em sua Carta a Lucílio, escreve: tenhamos diante dos olhos o fim que é o bem soberano, de modo que a ele tendam nossos esforços e se orientem todos os nossos atos e todas as nossas palavras, assim como ao marinheiro é necessária uma estrela que lhe dirija a navegação. Sem um propósito, a vida fica sem rumo.

Marco Túlio Cícero (106 a.C. 43 a.C.), foi um celebre advogado, político, escritor, orador, filósofo e cônsul da República Romana, expressou sua preocupação pelo “bem supremo” da vida e pelo “bem último” do governo do império, para conferir sentido à vida humana. Sobre o “bem supremo” e o “bem último”, Cícero escreve: No bem supremo e último, tudo fica bem cimentado. Caso se descuide ou desconheça algo nas demais coisas, o dano é proporcional a elas. Se não se sabe onde está o sumo bem, se obscurece toda a razão e o sentido da vida. No desconhecimento provem toda quantidade de erros que os homens andam à deriva de suas opiniões. Quando se determina e se conhece a finalidade das coisas e onde estão os bens e os males, encontrou-se o caminho da vida e a ordenação dos deveres.

Para que fins e finalidades foram criados e constituídos os cargos públicos? Por que estamos submetidos as leis e as regras de um Estado de direito? Para onde vamos ao não valorizar a coisa pública? Segundo Mônica Bergamo, jornalista e colunista do jornal Folha de São Paulo e da rádio BandNews FM, o governo pagou R$ 54.036,24 mil em passagem e diárias para namorada de Eduardo Pazuelo, a primeira-tenente Laura Appi, entre maio de 2002 a março de 2021, somente a fim de acompanhar o ex-ministro da saúde. Nesse mesmo período o ex-ministro recebeu nada menos que R$ 88,5 em diárias e ajuda de custo em viagens não oficiais.

E isso é justamente o que chamam de “nova política”. De fato, há o novo, custear com o dinheiro do povo despesas pessoais de quem já ganha em média R$ 106 mil reais, como o coronel e ex-ministro Pazuelo. A “nova política”, tem uma meta e um ideal, assim por diante, usurpar do público em benefício próprio e familiar, a partir da falta de uma visão e compromisso ético com o bem último e supremo, diz respeito a todos em geral. Essa distorção do ético e dos bens coletivos é um grande alarme que ressoa no Brasil nestes últimos anos. Efetivamente, a “nova política” não responde ao caráter ético, do coletivo e do bem último. Pois, nenhum cidadão civil foi custeado com dinheiro público para namorar e viajar com seu cupido, exceto a namorada dos ex-ministros da saúde.  

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

Enviar Correção

Comentários

Newsletter Tua Rádio

Receba gratuitamente o melhor conteúdo da Tua Rádio no seu e-mail e mantenha-se sempre atualizado.

Leia Mais