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É primavera!

Vanildo Luiz Zugno

Mesmo que, no calendário oficial, a primavera só comece no próximo dia 21 de setembro, na prática, o inverno já se foi. Ainda algumas frentes frias, cada vez mais rápidas e menos intensas, nos lembram da transição que está terminando. É bom ver as árvores brotando e as flores colorindo pátios, quintais e campos e ouvir os sabiás preparando os ninhos e buscando suas parceiras para a festa do amor que resultará em novos pássaros cruzando os céus.

Um tempo muito bonito que, esperamos, encerre uma temporada em que os eventos climáticos extremos se mostraram cada vez mais comuns e devastadores. Ainda no outono, o Rio Grande do Sul viveu o desastre climático mais amplo da história recente. A quase totalidade dos municípios do Estado foi atingida por chuvas torrenciais que escoaram as águas numa rapidez nunca antes vista para os rios que, nas partes altas de seus percursos, passaram arrasando e arrastando tudo o que encontravam pela frente até se espalharem pela planície do Delta do Jacuí onde mantiveram, durante um mês, bairros inteiros das cidades da Região Metropolitano de Porto Alegre inundados.

As perdas humanas só não foram maiores em função da ativa solidariedade que cresceu junto com as águas. Os danos materiais ainda não foram totalmente calculados. Sobre as sequelas sócio emocionais, só o tempo dirá das dimensões que alcançarão. E, lembremos, as enchentes de abril foram uma reprise ampliadas das de setembro de 2023 às quais quase ninguém – principalmente as autoridades públicas – deram a devida atenção.

A Amazônia e, com ela, boa parte do Brasil, está vivendo a maior seca de que se tem registro. E, com ela, os incêndios que destroem campos, plantações, florestas, o pantanal e alcançam as cidades. A seca é o fator climático. Mas está mais do que provado de que a maioria dos focos de fogo tiveram sua origem em mãos humanas.

A nível global, vivemos o mês de agosto mais quente desde que há registros das temperaturas: 1,5 graus Celsius acima da média da era pré-industrial. É pouco!, dizem os céticos climáticos. Mas o suficiente para elevar os níveis dos mares e tornar áreas costeiras de todos os continentes perigosamente inabitáveis. Sem falar das outras alterações que os dados coletados, ordenados e divulgados pelos cientistas nos mostram a cada dia.

Mesmo assim, numa atitude de dissonância climática coletiva, continuamos consumindo, comerciando e produzindo como se nada disso estivesse a acontecer e o futuro da humanidade e de todas as espécies vivas que conosco coabitam a Casa Comum que chamamos de Planeta Terra não estivesse em risco. Um futuro apocalíptico que a cada vez se mostra mais próximo. Não é uma questão de milhões nem de milhares de anos. É uma questão de décadas ou, talvez, de anos apenas.

O que fazer para que os pássaros continuem voando, as flores desabrochando, as águas em seu ciclo de vida evaporando das florestas, circulando pelos rios aéreos, condensando em nuvens para cair em gotas que irrigam as árvores que nos albergam com sua sombra suave e nos alimentam com suas folhas e frutos?

O primeiro passo é pessoal: livrar-nos da cultura produtivista e consumista que afirma serem os recursos naturais infinitos e a nossa possibilidade de consumo ilimitada. É uma mentira deslavada que precisa ser passada a limpo até darmo-nos conta de que já ultrapassamos a capacidade de reposição do Planeta Terra e estamos caminhando para o abismo econômico onde só os mais poderosos sobreviverão.

Como alternativa temos a cultura da frugalidade: produzir e consumir apenas aquilo que é necessário. Não é um contentar-se com pouco. É transitar para uma economia com mais qualidade e menos quantidade, que priorize bens duráveis e sustentáveis e processos que não tenham apenas em conta o prazer humano, mas a viabilidade nos ecossistemas específicos e no conjunto dos seres vivos.

E neste ano de 2024 temos uma segunda possibilidade: as eleições municipais. Afinal, o município é nossa primeira “casa comum” social. É nele que se fazem as opções que primeiro nos afetam na vida cotidiana. Na hora de discernir em qual candidato vamos votar, é importante que coloquemos a variante ecológica no jogo. Para os/as prefeitos/as e vereadores/as que pretendem a reeleição, é bom observar como, na atual gestão, manejaram as questões ambientais na cidade: licenciamento ambiental para obras e loteamentos; o manejo dos resíduos industriais e domiciliares; o cuidado com os parques e praças; o plantio de árvores em áreas degradadas; o tipo de estímulo fiscal a empreendimentos que geram passivos ambientais.

Os mesmos critérios podem ser usados para candidatos/as novatos/as. Observar bem suas propostas e observar os partidos aos quais eles pertencem. Nas Assembleias Legislativas e no Congresso Nacional, os partidos destes candidatos votaram a favor ou contra a desregulamentação ambienta? São daqueles que queriam “passar a boiada” sobre as leis ambientais e acabar com o pouco que ainda temos de biomas preservados que guardam a sobrevida de tantas espécies vegetais, animais e de nós humanos?

É uma questão importante para pensarmos neste mês de setembro em que a primavera se avizinha com o sol que brilha um pouco mais a cada dia, a vegetação que renasce depois do frio ou da seca e o ar que, dependendo de nossas opções, poderá continuar a encher nossos pulmões de esperança.

Sobre o autor

Vanildo Luiz Zugno

Frade Menor Capuchinho na Província do Rio Grande do Sul. Graduado em Filosofia (UCPEL - Pelotas), Mestre (Université Catholique de Lyon) e Doutor em Teologia (Faculdades EST - São Leopoldo). Professor na ESTEF - Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana (Porto Alegre)."

 

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